Com veto total do governador Romeu Zema (Novo), o projeto de lei que estabelece novas regras sobre a criação, para fins de reprodução e comercialização, de cães e gatos de raça em Minas Gerais, voltará à Assembleia Legislativa para que os deputados estaduais ratifiquem ou anulem a decisão do chefe do Executivo. Enquanto esperam a retomada dos trabalhos parlamentares, em fevereiro, protetores e ativistas da causa animal contam com a derrubada do veto, publicado na quarta-feira (15).
Os pedidos para que a Assembleia mude a rota traçada por Zema, entretanto, se chocam com “constrangimentos éticos”, porque, embora aplaudam o estabelecimento de regras para a criação de animais com objetivos comerciais, os protetores são contra todo e qualquer tipo de comercialização dos pets. O projeto vetado pelo governador, aliás, impede que pet shops vendam animais, o que inibiria a atuação de canis clandestinos.
Eliana Malta, ativista da causa animal com histórico de atuação em parceria com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), é uma das vozes contrárias à venda de animais. Na avaliação dela, endurecer as diretrizes para o controle das negociações de cães de gatos seria positivo para o controle populacional dos animais.
“Eles são seres sencientes. Ou seja: são dotados de sentimentos, têm consciência do que acontece ao seu redor e têm percepções conscientes do que lhes acontece. Sentem dor, medo, angústia, solidão, amor, alegria, raiva demonstrando de acordo com sua espécie e comportamento, Por isso somos contra, por princípio e valores inerentes à causa, a esse tipo de comercialização, pois animais não são mercadorias, diz.
Um item do projeto vetado diz que cães e gatos de raça só poderiam ser comercializados se já estivessem castrados — ou com compromisso assinado pelo tutor para garantir a castração em momento posterior. A exceção se dá porque, para algumas raças, a castração antes do primeiro cio é contraindicada, sob risco de comprometer o desenvolvimento hormonal dos bichanos.
O texto prevê apenas uma exceção à castração como condição para a venda: quando houver laudo veterinário desaconselhando a realização do procedimento.
Experiente, Eliana sabe que a proibição à comercialização é inconstitucional e, por isso, vê a menção à castração para controle populacional como um avanço.
“Já perdemos outras ações por esse mesmo entendimento jurídico. Por isso o PL é, por ora, um ganho à nossa causa”, avalia.
Ainda conforme o projeto, os animais só poderiam ser negociados após os 60 dias de vida e seriam microchipados e vacinados.
Outro item da proposta aprovada pelos deputados coíbe a reprodução de cães e gatos em condições precárias para fins comerciais. Se o veto for totalmente derrubado, a reprodução com esse objetivo só poderá ser feita por criadores inscritos no Cadastro Estadual de Criação e Comércio de Cães e Gatos de Raça de Minas Gerais (Cecar-MG).
Os criadores seriam obrigados a informar, ao Cecar, dados como as datas de nascimento, óbito, venda, castração e microchipagem dos animais. Cada criadouro precisaria contar com um veterinário responsável.
O projeto de lei também estabelece um limite de crias por matriz — fêmeas em idade reprodutiva. Assim, após o atingimento do teto, a fêmea precisaria ser castrada.
“Todas estas normas já fazem parte da rotina de criadores sérios e eticamente comprometidos com o bem-estar animal”, aponta Eliana Malta.
Pelo regimento interno da Assembleia de Minas Gerais, o veto — total ou parcial — depois de lido no plenário, é encaminhado para uma comissão para a emissão de um parecer, no prazo máximo de 20 dias. A partir de então, a Casa tem mais 30 dias para votar, em turno único, a decisão do Executivo. Para que os vetos sejam derrubados, precisa haver consentimento da maioria simples dos 77 parlamentares.
Nos últimos anos, a Assembleia tem feito acordos tidos como favoráveis à causa animal — o que anima as vozes contrárias ao veto. Em 2023, por exemplo, os parlamentares conseguiram retirar as rações para pets do rol de produtos atingidos por uma norma que aumentou, em dois pontos percentuais, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre bens considerados supérfluos.
O que diz o governo de Minas?
Ao justificar o veto, embora tenha reconhecido “a nobre intenção parlamentar de promover o bem-estar e a atividade de criação para fins de reprodução e comercialização de cães e gatos de raça no Estado”, o governador Romeu Zema apontou que ser “imprescindível o olhar sistêmico para o ordenamento jurídico-constitucional”.
Na avaliação de Zema, o projeto de lei geraria “um conjunto desproporcional e inadequado de exigências e condutas vedadas aos criadores, onerando o livre exercício da atividade econômica”.