Está na pauta do Senado o PL 826/2019, que obriga as escolas públicas a realizarem programas de vacinação.
O autor original do projeto, quem diria, é o deputado federal bolsonarista Domingos Sávio (PL-MG).
Sávio redigiu o projeto em 2019, antes da pandemia, quando Jair Bolsonaro ainda não havia assumido o discurso antivacina.
Lá em 2019, em seu texto original, Sávio expressou preocupação com a “queda da cobertura vacinal no Brasil” (que, como sabemos hoje, piorou nos anos seguintes).
Sávio acrescentou: “Traz perplexidade a quantidade de informações inverídicas que são divulgadas para provocar dúvidas nas pessoas acerca da eficácia e segurança das vacinas”. Pouco tempo depois, Bolsonaro contou várias mentiras sobre as vacinas. Disse que eram experimentais (quando já estavam aprovadas em ensaio clínico em fase III), que estavam associadas à Aids e até que transformariam gente em jacaré. Curiosamente, Sávio nunca criticou essas fantasias de Bolsonaro.
“O Programa Nacional de Vacinação em Escolas Públicas ora proposto é uma estratégia de resgate de não vacinados, convocando a população alvo à escola a fim de avaliar a necessidade de vacinação”, escreveu Sávio – lá em 2019, claro.
O projeto foi finalmente aprovado pela CCJ da Câmara em junho de 2023, com votos contrários apenas de deputados bolsonaristas, que agora já tinham adotado o discurso antivax. Com isso, seguiu direto para o Senado, contornando o plenário da Câmara. Sávio não votou na ocasião porque não era membro da CCJ.
No mês passado, a Comissão de Educação do Senado também aprovou o projeto, por 12 votos a 5. Votaram contra: Carlos Portinho, Eduardo Girão, Esperidião Amin, Magno Malta e Marcos Rogério. Todos bolsonaristas – votando contra um projeto de autoria de um também bolsonarista.
O projeto original de Sávio não tem nada demais. Apenas cria uma nova oportunidade de vacinação, com as escolas somando-se aos postos de saúde.
Em 2023, o bolsonarista Tarcísio de Freitas vetou um projeto muito parecido em São Paulo, que criaria um programa de vacinação contra o HPV nas escolas.
No debate no Senado, cedendo aos apelos dos bolsonaristas, o relator Marcelo Castro (MDB-PI) removeu o artigo 4º do texto de Sávio, que previa que as escolas públicas deveriam comunicar aos pais e unidades de saúde sobre as crianças que chegassem à escola sem o cartão de vacinação.
“Tudo isso aqui nós retiramos no acordo que nós fizemos, para ficar bem claro que não há obrigatoriedade de a criança ser vacinada”, disse Castro, na comissão. “Há a obrigatoriedade de a escola fazer a campanha, mas, se o pai disser “a criança não vai ser vacinada”, não vai”.
Em fevereiro, Sávio virou alvo de “influencers” bolsonaristas por ter sido autor do projeto. Ressaltou que sua ideia não é uma vacinação obrigatória. É verdade, mas ele não defendeu seu próprio artigo 4º, importante para a fiscalização da vacinação.
Sávio não quis dar entrevista a O Fator.
Sua assessoria de imprensa ressaltou que na época em que ele redigiu o projeto “sequer existia a COVID [ou] vacina para a COVID”.
Isso, claro, é irrelevante. O que não existia na época era Bolsonaro adotando o discurso antivacina.
A assessoria de Sávio não comentou o veto de Tarcísio a um projeto muito parecido com o dele.