Como depoimento colhido pela CPI da Lagoa da Pampulha virou caso de polícia

Servidora da Prefeitura de BH ouvida durante a investigação levou, a Juizado Especial, queixas sobre postura de vereador
Foto: Rafaella Ribeiro | CMBH

Um dos depoimentos colhidos pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Lagoa da Pampulha, conduzida por vereadores de Belo Horizonte, virou caso de polícia e ação judicial. O embate foi entre a engenheira Ana Paula Fernandes Furtado, da Diretoria de Gestão de Águas Urbanas — órgão da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) —, e o vereador Bráulio Lara (Novo), relator da CPI, cujo parecer foi aprovado nessa terça-feira (2).

A dissonância entre Ana Paula e Bráulio começou ainda na primeira CPI sobre a Lagoa da Pampulha, no ano passado. A servidora, porém, só procurou o Juizado Especial Criminal da Polícia Civil em 30 de janeiro deste ano — quando a primeira comissão de inquérito a respeito do espelho d’água já havia terminado e uma outra começava a funcionar.

Ana Paula afirmou, aos policiais, que Bráulio teria feito “perguntas de cunho pessoal”. Ela afirmou que, durante os seus dois depoimentos, nos dias 18 de março e 25 de abril, o vereador a interrompia e não permitia a conclusão de raciocínios, o que a deixou “extremamente desgastada emocionalmente”.

Como a participação na CPI foi transmitida ao vivo pelo YouTube da Câmara Municipal e virou tema de matérias jornalísticas ligadas aos trabalhos parlamentares, Ana Paula afirmou que a convocação lhe gerou “constrangimento público” e que passou a sofrer com “crises de ansiedade”. Por isso, ajuizou ação pedindo R$ 60 mil em indenização por dano moral e a remoção de seu nome de todas as publicações referentes à CPI — inclusive o relatório final da investigação.

Pedidos negados

O caso foi levado ao Juizado Especial de Fazenda Pública de BH, que negou todos os pedidos feitos pela servidora. Em sua sentença, o juiz Marco Antônio da Silva rejeitou o pedido de pagamento de danos morais, registrando não ter evidências de excesso de prerrogativa por parte do parlamentar.

“A partir daí, forçoso concluir que o réu, limitou-se a exercer seu papel de fiscalização, não sendo possível que se anteveja, de plano, a existência de intuito difamatório ou calunioso ou mesmo de extrapolação dos limites da prerrogativa de imunidade parlamentar, ao qual estava sujeito em razão do exercício de sua atividade legislativa”, anotou o magistrado em trecho da sentença.

Sobre a remoção das citações à Ana Paula, o juiz apontou que as matérias do site da Câmara Municipal retratam o que ocorreu nas reuniões da CPI – Lagoa da Pampulha, sem nenhum juízo de valor.

“O objetivo do site institucional é prestar contas à sociedade e zelar pela transparência das atividades legislativas, de modo que a retirada das noticias é forma de censurar, moderar, cercear ou interferir em sua liberdade de informar, direito fundamental garantido pelo art. 5º da Constituição Federal”, apontou.

Segundo Bráulio Lara, o processo foi uma tentativa de intimidação dos componentes da CPI.

“Fizeram ações coordenadas para me intimidar. Foram à justiça, à delegacia e também tentaram me tirar da cadeira de relator da CPI, mas nenhuma dessas tentativas foi para frente”.

Indiciamento sugerido

O relatório final da CPI sugere o indiciamento de 11 pessoas. Ana Paula Fernandes está na lista. O documento será encaminhado ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMPG)

Segundo as investigações dos vereadores, Ana Paula e Ricardo de Miranda Aroeira, outro integrante da Diretoria de Gestão de Águas Urbanas da PBH, teriam cometido os crimes de improbidade administrativa, fraude em licitação ou contrato, prevaricação, corrupção passiva, falsidade ideológica, condescendência criminosa, falsificação de documento público, estelionato e crimes contra o ordenamento jurídico e o Patrimônio Cultural”.

Ainda conforme o relatório, eles teriam tido “papel central na articulação e execução de um esquema para favorecer empresas e indivíduos nos contratos relacionados à qualidade das águas da Lagoa da Pampulha, prejudicando o erário municipal”.

Ana Paula e Ricardo de Miranda foram os responsáveis pelos relatórios técnicos que viabilizaram a contratação por inexigibilidade e dispensa de licitação do Consórcio Pampulha Viva, contratado para fazer a limpeza da água da Pampulha.

O Fator conversou com o advogado Jeferson Baeta, responsável pela defesa da engenheira. Ele explicou que recorrerá da decisão sobre o pedido de danos morais e da remoção do nome de Ana Paula nas citações relativas à CPI da Pampulha.  

Sobre o pedido de indiciamento, ele apontou que o relatório final é praticamente o mesmo apresentado anteriormente, na primeira CPI, e que foi rejeitado pelo Ministério Público.  

A Prefeitura de BH, por sua vez, optou por não comentar o relatório, mas emitiu comunicado para atestar a qualidade das águas do cartão-postal da Pampulha.

“As águas da Lagoa da Pampulha apresentam hoje qualidade suficiente para a prática de esportes náuticos e navegação. É o que demonstra análise técnica realizada com amostras coletadas no último dia 3 de junho e referente aos meses de março a maio deste ano. Todos os 27 parâmetros analisados obtiveram resultado positivo, especialmente o que diz respeito à presença de indicadores da existência de elementos patogênicos (que transmitem doenças): do limite de até 2,5 mil NPM/100 ml do E. Coli, a Lagoa apresentou índice de 220 NPM/100 ml – ou seja, menos de 10% do limite total. Para se ter uma ideia, o Rio Sena, em Paris, apresentou recentemente resultados superiores a 1.000 NPM/100ml, o que inviabiliza a prática de competições do triatlo e maratona aquática, e foi um alerta para os organizadores das Olimpíadas de Paris, que acontecerá daqui a menos de 30 dias”, aponta fragmento do texto.

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