Decreto de Bolsonaro mantido por Lula garante sigilo de reuniões

Texto dispensou necessidade de produção de atas das reuniões, com descrição dos assuntos tratados
20.02.2025 - Lula no Alvorada em entrevista para a Rádio Tupi FM
Lula no Alvorada: sigilo das atas de reuniões com lobistas. Foto: Ricardo Stuckert/PR

Um decreto presidencial assinado por Jair Bolsonaro, e mantido por Lula, dispensou ministros e outras autoridades de produzir atas de suas reuniões com lobistas e outros agentes particulares.

Um decreto assinado por FHC em 2002 disciplinou por quase vinte anos as audiências concedidas a particulares por agentes públicos federais.

O texto determinava que as autoridades públicas deveriam “manter registro específico das audiências, com a relação das pessoas presentes e os assuntos tratados”.

A determinação foi desobedecida várias vezes durante o governo Bolsonaro.

Em setembro de 2020 a revista Época revelou que uma audiência do então ministro Ricardo Salles com um grupo de indígenas e garimpeiros do Pará foi realizada fora da agenda e sem qualquer registro oficial.

No começo de 2021 a então ministra da Agricultura, Tereza Cristina, se reuniu com o presidente da Friboi, Renato Costa. A reunião não foi registrada em ata.

Meses depois, as reuniões da médica Ludhmila Hajjar com o então presidente Bolsonaro também não foram registradas em ata. Hajjar era cotada para assumir o Ministério da Saúde.

No fim daquele mesmo ano de 2021 os então ministros Wagner Rosário (CGU) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral) enviaram a Bolsonaro uma minuta de um novo decreto para substituir aquele editado por FHC. O documento foi obtido por O Fator via Lei de Acesso à Informação.

A equipe técnica da Casa Civil de Bolsonaro analisou a exposição de motivos e reconheceu a necessidade de regras para lidar com os lobistas.

“[S]ituações de lobby ocorrem, com frequência, durante a participação de agentes públicos em compromissos públicos”, diz Nota Técnica da Casa Civil assinada em 9 dezembro de 2021, o mesmo dia em que Bolsonaro assinou o decreto novo.

O novo decreto criou o e-Agendas, sistema eletrônico mantido pela CGU e de uso obrigatório por ministros e outras autoridades do Executivo federal.

Na prática, os ministros com frequência atualizam as agendas depois dos fatos ocorridos, e também deixam a agenda vazia.

Em janeiro deste ano, por exemplo, o ministro Fernando Haddad sumiu até do olhar atento dos setoristas, os experientes jornalistas de vários veículos que cobrem o Ministério da Fazenda. Apenas no fim da tarde o paradeiro do ministro foi revelado: ele tinha ido à residência oficial do presidente do Senado, que na época era Rodrigo Pacheco.

Mais importante, o novo decreto removeu a referência a “assuntos tratados” – na prática, dispensando a produção de atas produzidas durante ou depois das reuniões.

Assim, por exemplo, como O Fator mostrou, a ANP não produziu ata da reunião com a empresa Imetame Energia sobre a perfuração de poços na Bacia do São Francisco.

Da mesma forma, procurado desde 21 de fevereiro, o Ministério da Agricultura ainda não informou o que foi discutido em três reuniões com a JBS realizadas neste ano de 2025.

O Ministério da Gestão disse a O Fator que o decreto de 2021 criou o e-Agendas, mantido pela CGU, e direcionou nossas perguntas à CGU.

Não respondeu se pretende sugerir novo decreto, reobrigando a produção de atas.

A CGU não respondeu às nossas perguntas.

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