Uma investigação do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) identificou possíveis irregularidades em uma licitação feita pela Autarquia Municipal de Trânsito e Transportes de Contagem (Transcon). O edital em questão resultou em um contrato de R$ 7,7 milhões com a empresa Bridge Propaganda Comunicação e Editoração. Outras cinco renovações do contrato foram feitas — também com suspeitas de irregularidades.
A 24ª Promotoria da Defesa da Ordem Econômica, Tributária e de Defesa do Patrimônio Público, ligada ao MPMG, emitiu uma recomendação à Transcon para a suspensão do acordo. O documento aponta o sócio-administrador da empresa e um ex-presidente da Transcon como líderes de uma “associação criminosa”. A investigação começou após uma denúncia recebida pela Ouvidoria do Ministério Público.
Um levantamento feito por O Fator junto ao site do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG), aponta que neste período, entre a celebração do contrato e as suas cinco renovações, foram pagos mais de R$ 12 milhões à Bridge Propaganda, com a soma de todas as notas fiscais pagas pela Transcon em nome da empresa.
A denúncia encaminhada ao MPMG indicava possível manipulação no processo licitatório, com indícios de conluio para favorecer a Bridge a partir da cotação de preços com empresas de comunicação que estavam inativas. Uma apuração preliminar identificou que, das quatro empresas que participaram da concorrência, duas delas não anotaram movimentação no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) — registro de admissões, demissões e transferências de funcionários com contrato de trabalho.
Uma das empresas que apresentou orçamento, aponta a recomendação, sequer tinha Classificação Nacional das Atividades Econômicas (CNAE) para a prestação de serviços de marketing.
Também foi identificado que o representante de uma das concorrentes que participaram da licitação figura como investigado em outra ação do Ministério Público. Além disso, afirmao MP, “verificou-se que o mesmo responde a investigações policiais por estelionato em pelo menos quatro Estados da Federação: Bahia, Rio de Janeiro, Piauí e Goiás”.
Mesmo com um suposto acerto entre as concorrentes, os R$ 7,7 milhões referentes ao acordo com a Bridge equivalem a valor superior ao preço ofertado por outras empresas — o que, para o MP, sugere uma tentativa de inflacionar as cifras envolvidas o contrato.
Outro ponto suspeito, é que, após a licitação, o sócio-administrador de uma das empresas concorrentes passou a figurar na execução do contrato como representante da Bridge Propaganda.
Pareceres e renovações
A apuração preliminar aponta inconsistências e suspeitas também por parte de servidores da Transcon que participaram da contratação da empresa. O caso mais curioso é o parecer pela legalidade da renovação do contrato, em agosto de 2023, por uma assessora jurídica que já não figurava como servidora da autarquia.
Ainda neste caso, o MP teve acesso a uma troca de e-mails em que o setor jurídico da Transcon informa que “não iria se manifestar sobre o assunto” — a renovação do contrato — uma vez que o atual vice-presidente da Transcon, Leonardo Gonçalves Reis, informou que havia nomeado outra pessoa para a função.
Entretanto, este e-mail do setor jurídico é datado de setembro de 2023, enquanto o parecer jurídico apresentado pela ex-assessora é de agosto de 2023. Nos autos, a promotoria do MPMG ironiza o parecer da ex-assessora, dizendo que ele teria “brotado” nos autos.
Leonardo Gonçalves, atual vice-presidente da Transcon, foi quem assinou o contrato em 2020, segundo consta na recomendação MP, na condição de presidente da autarquia.
O contrato passou por diversos aditivos. No primeiro, em 2021, foram apresentados orçamentos suspeitos, novamente de empresas que já estavam baixadas. Segundo o documento, “há indícios de que os documentos tenham sido juntados aleatoriamente apenas para conferir aparência de legalidade à prorrogação do vínculo com a Bridge”.
No mesmo aditivo, chama atenção que diversos documentos cruciais foram elaborados em apenas um dia, incluindo “autorização da presidência”, “ofício de solicitação”, “previsão de dotação orçamentária” e “parecer jurídico”.
O que dizem os envolvidos?
A Transcon informou que vem colaborando de maneira proativa e sistemática com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e que vem seguindo todas as recomendações emitidas pelo órgão para que as eventuais dúvidas relativas ao contrato com a empresa Bridge Propaganda sejam devidamente esclarecidas. A Transcon também reafirmou seu compromisso com a transparência e a eficiência de todos os procedimentos administrativos adotados em suas contratações.
De março de 2020 até setembro de 2024, a Transcon informou que o contrato com a Bridge foi executado e um montante de R$ 12.778.995,05 foi pago. Mas segundo a autarquia “não houve pedido do MPMG para suspensão do contrato com a empresa, e ele foi encerrado normalmente em 13 de setembro de 2024 após o vencimento”.
Por fim, concluíram destacando que o MPMG solicitou à Controladoria Geral do Município (CGM) uma auditoria no contrato com a Bridge. “Essa auditoria está sendo realizada. Não houve até aqui, por parte do MPMG ou da CGM, qualquer recomendação para o afastamento de qualquer servidor da Transcon”.
A reportagem não conseguiu contato com a Bridge Propaganda. O espaço segue aberto para manifestações.