O que o governo de Minas alega na ação que quer obrigar o uso de câmeras corporais por parte de PMs

MPMG alegou, em fevereiro, que Estado tem desperdiçado equipamentos adquiridos por R$ 6,4 milhões
Segundo a ação, mais de 1.600 câmeras operacionais portáteis (COPs) foram adquiridas desde 2021, mas permanecem sem utilização efetiva. Foto: Agência Minas
Segundo a ação, mais de 1.600 câmeras operacionais portáteis (COPs) foram adquiridas desde 2021, mas permanecem sem utilização efetiva. Foto: Agência Minas

O governo de Minas argumentou que a ação Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) que busca obrigar a Polícia Militar a equipar todos os policiais em atividade ostensiva com câmeras corporais, ajuizada em fevereiro, “interfere indevidamente” na gestão e orçamento da segurança pública, além de alegar que a estratégia de treinamento intensivo dos policiais é mais eficiente. O Estado também aponta que a medida geraria altos custos de implementação, o fato de a adesão à portaria do Ministério da Justiça não ser obrigatória e a existência de equipamentos, já adquiridos por R$ 6,4 milhões, que permanecem sem uso.

A audiência de conciliação sobre o processo está prevista para ocorrer nesta quinta-feira (13).

Na ação, o MPMG afirma que mais de 1.600 câmeras corporais permanecem sem uso efetivo no estado. Os equipamentos foram comprados com recursos do Ministério Público (R$ 4 milhões) e do tesouro estadual (R$ 2,4 milhões). O MPMG aponta que a situação é ainda mais grave considerando que Minas Gerais está em Regime de Recuperação Fiscal, com dívidas que somam R$ 153,75 bilhões junto à União.

Além disso, o Ministério Público apresenta dados que mostram o impacto do uso de câmeras corporais na redução da letalidade policial. Em São Paulo, houve queda de 57% nas mortes decorrentes de intervenção policial após a implementação dos equipamentos. Em Santa Catarina, registrou-se redução de 61,2% no uso da força por policiais equipados com câmeras. Em Minas Gerais, segundo o MPMG, foram registradas 778 ocorrências com mortes por intervenção policial entre 2018 e 2023, resultando em 913 óbitos. Em 2024, houve aumento de 33,3% nas ocorrências em relação a 2023 e crescimento de 59,1% na comparação com 2020.

Na argumentação contrária, feita pela Advocacia-Geral do Estado (AGE-MG), o governo mineiro afirma que o MPMG tem conhecimento do planejamento e execução da PMMG para a implementação das câmeras, e que todas as informações solicitadas foram fornecidas. A AGE-MG cita ofício do Comandante-Geral da PMMG em que consta que “todas as informações solicitadas pelo órgão ministerial foram sempre apresentadas pela PMMG, com os dados relativos ao planejamento, à implementação, à execução e às alterações de metodologia do projeto-piloto atinentes às câmeras corporais”.

O MPMG contesta essa afirmação, alegando que, após diversas tentativas de diálogo com a Polícia Militar através de ofícios, não obteve respostas satisfatórias sobre o uso dos equipamentos.

‘Estratégia’

O Estado alega ainda que a distribuição inicial das câmeras foi seguida da necessidade de treinamento adequado, o que levou à redistribuição dos equipamentos para a Academia de Polícia Militar (APM) e para as Companhias de Ensino e Treinamento. Segundo a AGE, “ao contrário do que alega o MPMG, as câmeras corporais não foram utilizadas apenas de forma cerimonial pela PMMG”, mas sim para “incutir no seio da tropa a importância do uso das câmeras corporais, bem como treiná-la para o uso eficiente do equipamento”.

A AGE-MG também contesta a obrigatoriedade de adesão à Portaria nº 648/2024 do Ministério da Justiça e Segurança Pública, alegando que a norma “invade as prerrogativas estaduais” e não oferece recursos financeiros suficientes para o custeio da operação. A AGE defende a autonomia do Estado para definir sua política de segurança pública. O Ministério Público ressalta que o Ministério da Justiça e Segurança Pública lançou em novembro um edital de R$ 102 milhões para financiar projetos de câmeras operacionais portáteis nos estados. Minas Gerais não apresentou propostas para participar.

Na argumentação, o Estado alega que a implementação imediata do uso das COPs em toda a PMMG enfrenta desafios logísticos e financeiros significativos, tendo em vista a necessidade de aquisição de equipamentos para um efetivo de, aproximadamente, 40 mil policiais militares. A AGE estima que o custo total em 5 anos seria de R$ 1,2 bilhão caso o Estado optasse pela aquisição dos equipamentos e R$ 1,7 bilhão caso optasse pelo serviço de manutenção e dados.

A Advocacia estadual também rebateu a alegação do MPMG de que a letalidade policial em Minas Gerais é crescente, citando estudos que apontam o estado com uma das menores taxas do país. Para a AGE, a ação do MPMG configura uma “intromissão indevida na esfera da gestão, estratégia da instituição e orçamento estatal”, violando os princípios constitucionais do federalismo e da separação de poderes.

Defensoria

A Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) protocolou um pedido para participar como assistente litisconsorcial no processo. Na petição, protocolada nesta quarta-feira (12), a DPMG argumenta que o tema possui grande afinidade com suas funções institucionais, que incluem a defesa dos direitos humanos, a assistência jurídica gratuita aos necessitados e o controle social da atividade policial. A defensoria destaca que a falta de regulamentação do uso de COPs prejudica a transparência e a responsabilização da atuação policial, especialmente em casos de violência e letalidade.

A DPMG ressalta que a utilização de câmeras corporais pode contribuir para a qualificação da produção de provas em processos criminais, tanto para a defesa de civis quanto de policiais militares. A instituição aponta que a ausência de registros audiovisuais dificulta a comprovação de eventuais abusos policiais, mas também impede a proteção de agentes que atuam no estrito cumprimento do dever legal.

A defensoria também enfatiza que a população negra é a principal vítima da violência policial em Minas Gerais, conforme dados de estudos recentes. Nesse sentido, a DPMG argumenta que a implementação das câmeras corporais pode ajudar a reduzir a letalidade policial e a proteger os direitos dessa população vulnerável.

O pedido de habilitação da DPMG como assistente litisconsorcial ainda será analisado pela Justiça. Caso seja aceito, a defensoria poderá participar ativamente da ação, apresentando provas, argumentos e pedidos para garantir a efetiva implementação do uso de câmeras corporais pela polícia mineira.

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