Mulheres e Desenvolvimento: A perspectiva de gênero nas políticas econômicas — Um manifesto no Dia Internacional das Mulheres por políticas econômicas com perspectiva de gênero

Blocos representando os gêneros feminino e masculino
Se queremos falar de soluções reais e prioritárias, precisamos falar de políticas econômicas com a perspectiva de gênero. Foto: Freepik

No dia 8 de março, Dia Internacional das Mulheres, ganham força os debates sobre direitos das mulheres, conquistas, reivindicações e pautas atuais, desde o combate à violência de gênero até o trabalho não remunerado do cuidado, relembrando a história e o presente, ainda injusto com as mulheres e com uma lacuna de três séculos para a equidade. Esta data abre espaço para debatermos soluções reais e prioritárias, que ainda se mostram insuficientes no presente e para o nosso futuro.

Há anos venho estudando o tema da desigualdade de gênero, desde minha formação em Direito, em 2014. Quanto mais me aprofundo, mais percebo as conexões intrínsecas entre os modelos econômicos adotados por diversos países e a reprodução sistêmica das desigualdades nos mecanismos do Estado e na sociedade, nas esferas pública e privada.

Se queremos falar de soluções reais e prioritárias, precisamos falar de políticas econômicas com a perspectiva de gênero. Isso significa mudar o patamar da distribuição de renda e rever políticas tributárias para as mulheres, eliminar as desigualdades no mercado de trabalho, reconhecer o trabalho não remunerado do cuidado, garantir a autonomia econômica para as mulheres, desenvolver políticas públicas que respondam a esses problemas, desenvolver orçamentos com olhar sensível à gênero e financiar projetos de impacto para equidade.

Segundo dados do Banco Mundial (2024), a redução da desigualdade de gênero no mercado de trabalho poderia aumentar o PIB per capita global em 20%. A pesquisa mostra que países que eliminam barreiras legais para o trabalho feminino têm crescimento mais acelerado e maior inovação. Isso significa que, se as mulheres tivessem participação igual à dos homens na economia global, o PIB mundial poderia crescer em US$ 28 trilhões até 2025, de acordo com o McKinsey Global Institute (2020). Outras pesquisas indicam que eliminar a diferença de participação no mercado de trabalho entre homens e mulheres até 2060 poderia aumentar o PIB real per capita em 11,3% (OECD, 2024).

Já o Goldman Sachs (2018) identificou que investimentos em negócios liderados por mulheres geram retornos superiores à média do mercado. Entretanto, as mulheres ainda enfrentam um déficit de financiamento de US$ 1,7 trilhão para empreender, mas quando têm acesso a crédito, investem mais na comunidade e geram empregos, aumentando o retorno sobre o investimento.

Mais do que reivindicar mais direitos no Dia Internacional das Mulheres, é necessário também remodelar as políticas econômicas para permitir que as mulheres alcancem seu pleno potencial na sociedade. De acordo com o relatório de 2025 da Equileap, a presença de mulheres em cargos executivos de empresas cotadas globalmente permanece estagnada, com apenas 7% ocupando posições de CEO e 9% como presidentes de conselhos de administração. Além disso, houve um retrocesso na igualdade salarial de gênero, indicando a necessidade de políticas mais eficazes para promover a equidade.

Estudos destacam que a subutilização do talento feminino representa um custo econômico significativo. Por exemplo, o trabalho não remunerado das mulheres (cuidados com a casa, crianças e idosos) equivale a 10% a 39% do PIB de muitos países (ONU, 2020). A Organização Internacional do Trabalho (OIT) constatou que, se o trabalho doméstico fosse redistribuído de forma equitativa, a produtividade econômica global poderia aumentar significativamente.

Em 2023, a economista Claudia Goldin recebeu o Prêmio Nobel de Ciências Econômicas por suas pesquisas sobre a participação feminina no mercado de trabalho e a persistente disparidade salarial entre homens e mulheres. Em uma reportagem do “El País”, é destacado que “em sua obra seminal “Understanding the Gender Gap: An Economic History of American Women” (1990), Goldin analisa a trajetória das mulheres no mercado de trabalho dos Estados Unidos, desafiando mitos sobre a desigualdade de gênero no âmbito profissional. Ela destaca que fatores como crescimento econômico e educação, isoladamente, não são suficientes para eliminar a disparidade de gênero. Goldin enfatiza que os modelos de trabalho e os mecanismos de ascensão profissional frequentemente favorecem os homens, perpetuando as diferenças salariais.” (El País, 2023)

Ainda, de acordo com a reportagem  da jornalista Amanda Mars, do “El País”: “Sua pesquisa também aborda como a disponibilidade para o trabalho (presenteísmo) impacta a desigualdade de gênero, ressaltando que, embora as mulheres tenham avançado profissionalmente, ainda enfrentam desafios significativos no equilíbrio entre carreira e responsabilidades domésticas. Goldin sugere que políticas como licenças parentais iguais podem contribuir para mitigar essas disparidades, mas reconhece que soluções mais abrangentes são necessárias para alcançar a equidade de gênero no mercado de trabalho.”(El País, 2023)

Isso evidencia a necessidade de políticas econômicas alinhadas à realidade social das mulheres, promovendo maior geração de renda e impulsionando um crescimento efetivo na economia e no PIB. Temos a oportunidade de fortalecer o orçamento com uma perspectiva de gênero, garantindo que os recursos sejam direcionados e aplicados de forma estratégica para beneficiar as mulheres.

No Brasil, iniciativas têm sido implementadas para incorporar a perspectiva de gênero no orçamento público. Em 2024, o Ministério do Planejamento e Orçamento, em parceria com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), lançou o “Projeto Revisão de Orçamentação Sensível a Gênero no Brasil”. Este projeto visa revisar e aprimorar a alocação de recursos públicos com foco na promoção da igualdade de gênero. No orçamento daquele ano, foram previstos R$14,1 bilhões para a “Agenda Mulheres”, segundo dados do Governo Federal.

Contudo, a Gênero e Número apontou que a Orçamentação Sensível ao Gênero ainda enfrenta desafios. Em muitos estados e municípios, a falta de transparência na destinação dos recursos impede o devido monitoramento e avaliação das políticas públicas. A ausência de dados desagregados por gênero e a falta de capacitação técnica para a elaboração de orçamentos sensíveis ao gênero são desafios a superar.

Neste 8 de março, além de reforçar o combate a todas as formas de violência contra as mulheres, é urgente que o setor público e privado adotem medidas concretas para o desenvolvimento de políticas econômicas inclusivas. Garantir a equidade de gênero na economia não é apenas uma questão de justiça social, mas também um imperativo para o crescimento sustentável e o desenvolvimento global.

A implementação de políticas fiscais, tributárias e orçamentárias sensíveis ao gênero, aliada à remoção das barreiras estruturais que impedem a plena participação das mulheres no mercado de trabalho e no empreendedorismo, é fundamental para destravar seu potencial produtivo e inovador. Este é um chamado para que governos, empresas e sociedade civil atuem de forma coordenada, assegurando que o progresso econômico seja verdadeiramente equitativo. Mais do que um manifesto, é um compromisso inadiável com um futuro em que as mulheres tenham oportunidades plenas para prosperar. 

Referências:

BANCO MUNDIAL. Women, Business and the Law 2024. Washington, DC: World Bank, 2024. Disponível em: https://wbl.worldbank.org

EQUILEAP. Gender Equality Global Report & Ranking 2025. Equileap, 2025. Disponível em: https://equileap.com

GÊNERO E NÚMERO. Orçamento Sensível ao Gênero: desafios e oportunidades no Brasil. Rio de Janeiro: Gênero e Número, 2024. Disponível em: https://generonumero.media

GOLDIN, Claudia. Understanding the Gender Gap: An Economic History of American Women. New York: Oxford University Press, 1990.

GOLDMAN SACHS. Giving Credit Where It Is Due: How Closing the Credit Gap for Women-Owned SMEs Can Drive Global Growth. Goldman Sachs, 2018. Disponível em: https://www.goldmansachs.com

MARS, Amanda. Claudia Goldin e a desigualdade de gênero no mercado de trabalho. El País, 2023. Disponível em: https://elpais.com

McKINSEY GLOBAL INSTITUTE. The Power of Parity: How Advancing Women’s Equality Can Add $12 Trillion to Global Growth. McKinsey & Company, 2020. Disponível em: https://www.mckinsey.com

OECD. The Pursuit of Gender Equality: An Uphill Battle. Paris: OECD Publishing, 2024. Disponível em: https://www.oecd.org

ONU MULHERES. O valor do trabalho de cuidado não remunerado. Nova York: ONU, 2020. Disponível em: https://www.unwomen.org

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT). Care Work and Care Jobs for the Future of Decent Work. Genebra: OIT, 2018. Disponível em: https://www.ilo.org

PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (Brasil). Projeto Revisão de Orçamentação Sensível a Gênero no Brasil. Brasília: Ministério do Planejamento e Orçamento, 2024. Disponível em: https://www.gov.br

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