Uma cidade dentro de outra: como vereadores do Barreiro fazem ‘divisão de terras’ na caça aos votos

Dona de mais de 11% do eleitorado de BH, região é alvo de candidatos ao Legislativo, que se organizam para evitar ‘cotoveladas’
Foto mostra a Praça do Cristo Redentor, no Barreiro
Barreiro conta com a Praça do Cristo, no Milionários. Foto: Rogério França/PBH

Com cerca de 300 mil habitantes, a região do Barreiro é mais antiga que a própria cidade de Belo Horizonte. Enquanto a capital mineira tem 126 anos, o Barreiro comemorou, no último dia 3 de agosto, 169 anos de existência. Com um senso de pertencimento muito próprio, parte de seus moradores se reconhecem mais como barreirenses do que como belo-horizontinos. Não por acaso, em 2013, cogitaram a emancipação da região — o que, se tivesse acontecido, faria da área a 8ª maior cidade de Minas Gerais

Sete dos 41 vereadores de Belo Horizonte são oriundos do Barreiro. Embora alguns deles trabalhem conjuntamente em alguns nacos dos 53 quilômetros quadrados da área, são eleitos por regiões e bairros específicos, o que contribui para a divisão natural deles território afora.

“Tem espaço para todo mundo e condições de eleger mais uns dois vereadores aqui no Barreiro”, diz, otimista, um assessor parlamentar ouvido sob reservas por O Fator.

Os barreirenses da Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) são Claudiney Dulim (Avante), Helinho da Farmácia (PSD), Iza Lourença (Psol), Janaína Cardoso (União Brasil), Juliano Lopes (Podemos) e Wanderley Porto (PRD). Há, ainda, Henrique Braga (MDB), que é morador da região e, apesar de ter votos territoriais, tem a maioria de seus apoiadores ligados ao segmento evangélico por ser pastor da Igreja do Evangelho Quadrangular.

Por ter uma representação de cunho ideológico, alinhada a princípios à esquerda, Iza Lourença tem atuação em todo o Barreiro. Os outros cinco barreirenses da CMBH, por sua vez, estão espalhados por bairros da região. Juliano Lopes e Janaína Cardoso, por exemplo, têm atuação em locais como Teixeira Dias, Barreiro de Baixo e Barreiro de Cima, enquanto Helinho da Farmácia é ligado ao Bonsucesso.

Já Claudiney Dulim atua no Barreiro de Cima, bairro que também conta com apoiadores de Wanderley Porto. O vereador do PRD também está ligado ao Tirol e ao Vale do Jatobá.

Nos bastidores, o entendimento é que a divisão territorial do Barreiro entre os vereadores ajuda a impedir as “cotoveladas” por disputas de espaço. Assim, os parlamentares conseguem atuar conjuntamente por melhorias para a região.

Hoje secretário municipal de Governo da Prefeitura de BH, Anselmo José Domingos (União Brasil), ex-vereador e ex-deputado estadual ligado ao Barreiro, confirma essa dinâmica. Segundo ele, a população barreirense tem o costume de ser politizada, o que facilita o surgimento de lideranças locais.

O Orçamento Participativo, por exemplo, criou muitas lideranças na região. A última ação que mobilizou a comunidade e destacou novas lideranças foi a atração do Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG)”, aponta..

Em legislaturas anteriores, o Barreiro chegou a ter nove dos 41 assentos do Parlamento Municipal. “Fora do período eleitoral, a relação entre os parlamentares é boa. Eles têm a percepção de que precisam atuar conjuntamente, o que favorece a região como um todo. Mas nas eleições o clima acirra um pouco”, indica Anselmo.

A influência política do Barreiro não é refletida apenas na Câmara Municipal. Em 2010, a região elegeu dois representantes na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG): Anselmo Domingos e Célio Moreira. Atualmente, há um deputado federal identificado com os bairros barreirenses: Marcelo Álvaro Antônio (PL), que herdou o espólio político do seu pai, Álvaro Antônio, por muitos anos vereador.

Para Anderson Siqueira, diretor do Jornal Milionários, veículo que circula nas imediações do bairro homônimo, parte da força política do Barreiro está relacionada à independência econômica da região.

“Saímos da região para poucas situações. Vira e mexe surge a pauta de municipalização do Barreiro”, expõe.

Para efeitos de comparação, a região de Venda Nova, com aproximadamente 247.315 habitantes, não tem nenhum vereador no exercício do mandato. Com votos dos venda-novenses, Bim da Ambulância (Avante) foi reeleito quatro anos atrás, mas renunciou para assumir como deputado estadual.

O ‘novo velho’ metrô

O peso político do Barreiro, exposto no número de eleitores da região, faz com que os candidatos a prefeito precisem desenvolver uma espécie de “segunda campanha” para conquistar os moradores dos bairros dessa “quase-cidade”, que correspondem a 11,82% da massa eleitoral da capital mineira.

Para além dos números, está o debate sobre a ampliação do metrô de Belo Horizonte. À reportagem, ao citar propostas para o Barreiro, o prefeito Fuad Noman (PSD), candidato à reeleição, citou o processo de licenciamento para as obras da linha 2 do trem urbano, que vai ligar o Barreiro ao Calafate. Segundo o prefeito, o Executivo “atua intensamente” em prol das autorizações necessárias para o pontapé inicial dos trabalhos de campo.

Fuad citou, ainda, as articulações por um corredor do Move na Avenida Amazonas. ”O projeto já está sendo executado e vai melhorar muito a mobilidade na região”.

O metrô também está na ponta da língua de Carlos Viana (Podemos). A ideia é que a construção da nova linha do trem urbano amplie a capacidade do modal de transportar passageiros. Atualmente, o metrô belo-horizontino tem apenas um itinerário, que vai de Venda Nova ao Eldorado, já em Contagem.

“A Linha 2 do metrô (Calafate- Barreiro) terá de ser entregue contratualmente, entre os anos de 2027 e 2028. Não é uma promessa, é um contrato com o BNDES”, projeta Viana.

Para o professor Wanderson Rocha, que representa o PSTU na disputa pelo Executivo municipal, a chegada do metrô ao Barreiro é pauta fundamental da eleição deste ano.

“Desde sempre e fomos parte ativa das lutas da região para obter essa conquista, que continua ameaçada, pois o projeto da empresa privatizada nem de longe atinge as necessidades da região”, analisa.

Sola de sapato

De acordo com o Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG), o Barreiro tem duas zonas eleitorais: a 36ª, com 95.030 eleitores aptos a votar, e a 333ª, com 235.589. Diante dos números, comitês de campanha passaram a apostar nas ruas barreirenses como palco de caminhadas e outros eventos políticos.

“Quando Aécio Neves disputou a Presidência da República, fez uma grande caminhada por aqui. Ciro Gomes, nas eleições presidenciais de 2002, veio acompanhado da sua então esposa, a atriz Patrícia Pillar. Isso reuniu muita gente”, relembra o ex-vereador Ronaldo Gontijo.

Caminhar pelas ruas do Barreiro foi o que o deputado estadual Mauro Tramonte, candidato à Prefeitura de BH pelo Republicanos, fez nessa segunda-feira (19). À reportagem, ele disse que, enquanto parlamentar, tem o costume de destinar emendas parlamentares a ações de saúde e educação no Barreiro.

“Sempre vou ao Barreiro, um lugar que me ajudou muito a pensar em soluções para os problemas da cidade. São muitas as lideranças que estão conosco no Barreiro. Estive hoje na região e com certeza voltarei mais vezes”, garante.

Para Duda Salabert, do PDT, o Barreiro é “essência e essencial”. “Ele data de antes da fundação de Belo Horizonte. Então, para falar da história de BH, precisamos falar do Barreiro”, avalia.

A parlamentar chama a atenção para a falta de psiquiatras no Centro de Referência em Saúde Mental (Cersam) do Barreiro e para baixa oferta de empregos

“Segundo dados da RAIS 2019, o Barreiro concentrava apenas a 6ª posição em oferta de emprego, entre as regionais, com pouco mais de 5% dos empregos, embora sua população seja uma das três maiores da cidade”, cita.

Rogério Correia (PT), por sua vez, defende ações de mobilidade e obras na área de saúde para o Barreiro. A atenção aos idosos da região também está na mira do petista.

“Teremos um grande programa de transferência de renda e políticas de cuidados e proteção social, sobretudo, para pessoas idosas, que abrange uma parcela significativa da Região do Barreiro”.

Já o candidato do MDB, Gabriel Azevedo, esteve no bairro Vale do Jatobá nesse domingo (18). Ele avalia que o Barreiro é um dos pontos estratégicos para a promoção do desenvolvimento socioeconômico e defende a criação de uma zona de incentivo à industrialização de alta tecnologia. Para atrair empresas, a ideia é oferecer uma política tributária que desperte interesse do setor privado.

“Quero fazer prefeituras regionais, ter gente de cada lugar da cidade, do Barreiro, Venda Nova, da Norte, da Centro-sul, cada um cuidando do seu bairro de maneira local. Prefeito não pode querer concentrar as coisas no gabinete, ele tem que distribuir o poder”, promete.

Autonomia às regionais também é pauta de Bruno Engler (PL). “No Barreiro está um dos mais importantes hospitais públicos da cidade, o Dr. Célio de Castro. E da mesma forma que disse em Venda Nova, no último sábado, precisamos estimular e facilitar o empreendedorismo na nossa cidade, para dar mais oportunidades àqueles que querem ter o próprio negócio e gerar emprego e renda. E, nesse ponto, o Barreiro é um importante alvo das nossas propostas”, avalia.

Lourdes Francisco, do PCO, aponta o caráter industrial do Barreiro como elemento importante para entender as necessidades dos moradores. Segundo ela, é preciso ampliar a oferta de transporte público rumo aos bairros centrais e acelerar a construção de uma nova linha do metrô.

A candidata do PCO, aliás, está de olho em conquistar os eleitores barreirenses. Para isso, programa panfletagens e mobilizações na região.

“Nosso objetivo é levar as ideias do PCO, um partido operário, aos bairros operários, como é o caso do Barreiro”, explica.

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