Municípios mineiros solicitaram ao Supremo Tribunal Federal (STF) a convocação de uma audiência pública para discutir a legitimidade das prefeituras em ajuizar ações judiciais em jurisdições estrangeiras, uma prática contestada pelo Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM) na Corte.
Ao todo, 30 cidades de Minas assinaram a petição, feita no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 178 nesta quinta-feira (17).
No processo, o IBRAM argumenta que a atuação dos municípios no exterior viola preceitos fundamentais da Constituição Federal, como a soberania nacional e o pacto federativo. A entidade pede a declaração de inconstitucionalidade dessa prática e a invalidação dos atos administrativos municipais relacionados.
Os municípios defendem que a questão é crucial para a autonomia política dos entes subnacionais e pode afetar significativamente o setor minerário e outros agentes econômicos. Eles destacam que a decisão do STF terá implicações amplas para as relações institucionais interfederativas e internacionais.
A audiência pública é vista pelos municípios como “essencial para promover um debate aprofundado sobre o tema”. Os municípios argumentam que esse formato permitirá a participação de especialistas, representantes da sociedade civil e autoridades técnico-científicas, oferecendo ao STF subsídios técnicos necessários para a resolução da controvérsia.
A ação no STF também está relacionada ao maior desastre ambiental da história do Brasil, ocorrido em Mariana, em 2015. Na Justiça inglesa, municípios mineiros e capixabas acionaram a mineradora BHP Billiton pelo rompimento da barragem da Samarco, controlada pela BHP e pela Vale.
A petição feita nesta quinta ressalta que o julgamento da ADPF pode restringir a autonomia municipal e estadual prevista na Constituição Federal. A Nova Lei de Licitações já prevê a possibilidade de licitações internacionais, indicando um cenário globalizado de trocas econômicas entre agentes subnacionais brasileiros e entes internacionais.
Assinam a petição as procuradorias dos municípios de Aracruz, Córrego Novo, Governador Valadares, Coronel Fabriciano, Ipatinga, Conselheiro Pena, Bom Jesus do Galho, Belo Oriente, Naque, Colatina, Rio Doce, Barra Longa, Ipaba, Alpercata, Periquito, Resplendor, Baixo Guandu, Ouro Preto, Engenheiro Caldas, Itueta, Aimorés, Tumiritinga, Marilândia, Açucena, Bugre, Santa Cruz do Escalvado, Nova Viçosa, Galiléia, São José do Goiabal e Dionísio.
Contratos
Na semana passada, o ministro Flávio Dino, relator do processo, proibiu que municípios brasileiros efetuem qualquer pagamento de honorários advocatícios baseados em cláusulas de êxito (ad exitum) sem prévia análise de legalidade por parte das instâncias soberanas do Estado brasileiro, especialmente o STF.
Além disso, o ministro determinou que os municípios exibam os contratos celebrados com escritórios de advocacia estrangeiros para ajuizamento de ações no exterior. A medida visa aferir as condições em que municípios brasileiros litigam diante de tribunais estrangeiros, considerando as possíveis consequências para o patrimônio público nacional e para a efetiva reparação de danos ocorridos no Brasil.
Ação
O Ibram alega que os municípios estariam usurpando competências da União ao agirem como entes com personalidade jurídica internacional, violando preceitos fundamentais relacionados à soberania nacional, ao pacto federativo e à organização do Poder Judiciário brasileiro.
Na avaliação do Ibram, a prática “fere a soberania brasileira e os princípios constitucionais, além de escapar ao controle do Poder Público e do Ministério Público”. Na ação, o instituto aponta que a Constituição “estabelece que compete à União representar e agir em nome da federação em âmbito internacional. Dessa forma, qualquer ação judicial proposta no exterior pelos municípios deveria contar com a anuência da União, garantindo a coerência e a unidade da representação internacional do Brasil”.
A petição do Ibram indica nominalmente 60 municípios que ajuizaram ações na Inglaterra, Holanda, Alemanha e Estados Unidos contra empresas como Vale, BHP e TÜV SÜD, buscando ressarcimento pelos danos causados por desastres ambientais como os rompimentos de barragens em Mariana e Brumadinho.