Muitos propagam que o Brasil é o país onde o rico fica mais rico, enquanto o pobre fica cada vez mais pobre. Além de culparem os empreendedores por uma suposta concentração de renda, aqueles que condenam o esforço e o sacrifício privado também culpam os investidores por um suposto enriquecimento antiético. Mas, afinal, por que o Brasil é conhecido como o país da renda fixa?
Na esteira da notícia, nestes últimos dias tivemos três importantes acontecimentos:
- A B3, a única Bolsa de Valores do Brasil, teve o pior desempenho do mundo em 2024;
- O Real é a quinta pior moeda em 2024, perdendo mais valor do que o famigerado Peso Argentino;
- O COPOM, na última quarta-feira (19/06/2024), anunciou por unanimidade a manutenção da taxa básica de juros em 10,50%.
Diante dessas notícias, partimos para a explicação de por que o Brasil é o país do rentismo.
Em primeiro lugar, empreender no Brasil sempre é uma aventura, seja você um microempreendedor individual ou uma gigante do varejo. Alta carga tributária, processos muito burocráticos para iniciar a operação, baixíssima segurança jurídica, risco alto de corrupção de órgãos fiscalizadores, mão de obra escassa e pouco qualificada, violência urbana e rural e baixa infraestrutura instalada são alguns dos problemas crônicos que temos em nosso ambiente de negócios. O Brasil é conhecido como um dos piores lugares para se empreender no mundo.
Em segundo lugar, o alto gasto do setor público. Quando o governo gasta mais do que arrecada, ele necessariamente precisará encontrar um caminho para financiar esse excesso de gasto. Existem algumas formas que são ou foram muito utilizadas em um passado não muito distante. Uma delas é a emissão de títulos da dívida pública (os famosos Títulos do Tesouro). O risco de um país, ou de qualquer outra instituição planetária, está atrelado ao seu nível de endividamento e sua capacidade de gerar receita para cumprir os acordos com seus devedores. O Brasil, como você deve saber, não gosta muito de manter suas contas públicas em dia, o que fatalmente leva a um constante endividamento e a uma redução cada vez maior da sua capacidade de liquidar no curto ou médio prazo seus compromissos financeiros. Além disso, temos a competição com outros países que são mais seguros e captam mais investidores para seus próprios títulos. Com isso, temos um crescente risco, fazendo com que o prêmio que o poder público tenha que pagar para conseguir rolar sua dívida tenda sempre a ser alto, fazendo com que a taxa básica de juros seja sempre elevada.
Já em terceiro lugar, é uma consequência do segundo ponto. Quanto maior o endividamento do setor público, maior o prêmio a ser pago, mais necessidade de consumo de crédito o poder público terá. Hoje, quase 50% do crédito é direcionado ao poder público. Emprestar para governos, em geral, é o investimento mais seguro a ser feito, uma vez que o poder público pode rolar mais dívida, aumentar impostos, usar emissão monetária (imprimir dinheiro, em bom português), vender terrenos, imóveis e empresas públicas e até mesmo desapropriar propriedades particulares para fins arrecadatórios para, enfim, pagar suas dívidas. Com isso, a competição pelo crédito pelo setor privado fica ainda mais concorrida. Como você pode imaginar, quanto menor a oferta, mais escasso é o credito, maior serão os juros. O setor produtivo sempre necessitará pagar mais caro pelo crédito, tornando sua atividade ainda mais arriscada. E, aqui, nem vamos entrar na farra do crédito direcionado feito pelo BNDS. Que faz as vezes do Robin Hood às avessas, tirando do pobre e dando para o rico.
Em quarto lugar, terminando a lista de motivos (que seria quase interminável), está o péssimo histórico do país no controle inflacionário. O brasileiro sempre conviveu com inflação. Os últimos trinta anos são a exceção. Todavia, se compararmos com outras moedas, o Real, melhor moeda de nossa história, continua rotineiramente sendo uma das moedas que mais perde valor no mundo. A lembrança inflacionária brasileira torna o Banco Central, responsável pela política monetária, sempre muito conservador em suas medidas, tornando o juro real brasileiro sempre um dos mais altos do mundo, considerando a taxa básica menos a inflação corrente.
Nessa medida, quando o poupador (algo raro no Brasil) escolhe onde aplicar seu precioso dinheiro, ele vai optar, obviamente, por produtos que sejam seguros e que tenham bons rendimentos, como o Tesouro Direto (Títulos Públicos), os Certificados de Depósito Bancário e as Letras de Crédito Agrícolas ou Imobiliários (Crédito Privado). Hoje, em junho de 2024, você encontra títulos públicos que pagam cerca de 6,50% + IPCA ao ano ou CDB, garantido pelo Fundo Garantidor de Crédito, 14,00% ao ano. Nessa seara, por que o investidor optaria por empreender por conta própria ou investir em empresas de capital aberto ou em fundos imobiliários, que possuem maior risco e maior volatilidade, mesmo tendo na Bolsa boas empresas pagadoras de dividendos ou que apresentaram grande crescimento nos últimos anos?
Enquanto o poder público não entender que ele é a principal causa por trás do “rentismo”, muito pouco mudará no país. Controle dos gastos públicos, diminuição da dívida pública, fortalecimento do Real, proporcionar segurança jurídica, realizar desburocratização, facilitar o ambiente de negócios e garantir a isonomia quanto ao acesso ao crédito são algumas das medidas para a Taxa Selic cair, fazendo com que o custo de oportunidade entre renda fixa e renda variável ou empreender seja cada vez menor.
Mas no fundo, aqueles que mais atacam o “rentismo” são os que mais causam esse fenômeno.