Ao confirmar apoio à reeleição da prefeita Marília Campos, do PT, o diretório do PSDB de Contagem pôs fim a uma rivalidade de mais de 20 anos na cidade da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). A “superação” dos sucessivos embates entre tucanos e petistas aconteceu na noite dessa segunda-feira (29), durante a convenção que selou o embarque do PSDB na campanha de Marília. Apesar do acerto, a coligação tem gosto amargo para parte dos tucanos contagenses, que avaliam a aliança como a “rendição” da legenda aos adversários.
Para Marília, a obtenção do apoio do PSDB serve de ensaio para aproximar os partidos, que por anos foram as duas principais forças democráticas do país. No contexto eleitoral da cidade, a prefeita aponta que a coligação com os tucanos confirma o isolamento da oposição.
“Estamos construindo uma coligação com mais 15 partidos, que reconhecem o nosso trabalho da nossa atual gestão, mas, sobretudo, acreditam no nosso projeto para a cidade nos próximos quatros anos”, diz.
Para o presidente do PT de Contagem, Adriano Fernandes de Faria, houve um arrefecimento natural das diferenças entre tucanos e petistas no plano municipal. “A social-democracia dos tucanos tem muitos mais pontos de convergência com a nossa linha socialista. Hoje nós temos a oportunidade de celebrar todos esses pontos em comum”, indica.
Apesar da união, parte dos filiados ao PSDB não gostou da aliança com o antigo adversário. Uma troca de mensagens entre alguns tucanos da cidade, a que O Fator teve acesso e confirmou a veracidade, registra a “perplexidade” com coligação.
“Quem diria que iria ver o PT e o PSDB de Contagem juntos. O que virou o nosso partido? Como fica para 2026?”, projeta um dos militantes.
Tendo participado de boa parte dessa disputa entre tucanos e petistas, o ex-presidente do PSDB de Contagem (1998-2001), Walter Barbosa, vê com maus olhos a aliança com os antigos adversários e critica a decisão do PSDB local.
“A atual direção não tem nada para levar, não representa as tradições do PSDB, não tem nenhuma relação com o que o PSDB foi em termos ideológicos e partidários”, protesta.
Walter critica a atual polarização política do país, dizendo que o embate entre o PT e o PSDB era entre propostas. Ainda assim, não acompanhará o apoio do seu partido. “Eu tenho vergonha do PSDB de Contagem, eu acho ele um vexame. Eles se entregaram ao poder, à prefeitura, se entregaram ao PT de Contagem. Não tem uma cláusula desse apoio que seja programática”, completa.
A reportagem procurou o ex-prefeito Ademir Lucas, que, sob a bandeira do PSDB, enfrentou Marília nas urnas em ocasiões anteriores. Ele, porém, preferiu não se manifestar por estar filiado ao União Brasil. Sua nova legenda também vai apoiar a reeleição da prefeita.
O Fator também acionou o presidente do PSDB de Contagem, Marius Carvalho, mas ainda não houve retorno. Em caso de resposta, este texto será atualizado. Em 2021, Marius chegou a acionar o Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG) a fim de questionar uma licitação da prefeitura.
Histórico de embates
Marília chegou ao comando do Poder Executivo pela primeira vez nas eleições de 2004, vencendo Ademir Lucas. A partir daí, a polarização política da cidade se firmou entre tucanos e petistas, tal como no plano federal. Quatro anos depois, novamente contra Ademir, Marília conquistou a reeleição.
Em 2012, com Marília impossibilitada de tentar um terceiro mandato, o PT lançou o então deputado estadual Durval Ângelo, hoje conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Houve, novamente, embate entre petistas e tucanos, mais uma vez representados por Ademir. Apesar disso, Carlin Moura (então no PCdoB), saiu vitorioso derrotando Durval no segundo turno.
O PSDB só voltou ao comando da Prefeitura de Contagem em 2016 — mas sem um embate direito com os petistas. O diretório do PT de Contagem apoiou a campanha à reeleição de Carlin, que fora derrotado pelo “neo-tucano” Alex de Freitas.
Mas Alex teve uma passagem curta pelo PSDB. Filou-se em 2016 e saiu do “ninho” em 2019, em meio a investigações contra lideranças tucanas. Atualmente, o ex-prefeito de Contagem é o presidente do Avante em Minas.
Nas eleições de 2020, o PSDB apoiou a candidatura à prefeitura de Coronel Alvear, pelo Cidadania e, no segundo turno, liberou a militância.
‘Puxão de orelha’
A aproximação entre os dois partidos precisou de um “freio de arrumação” do presidente estadual do PSDB de Minas Gerais, deputado federal Paulo Abi-Ackel, para alinhar o discurso do diretório municipal de Contagem após divergências internas sobre o apoio à reeleição de Marília.
O imbróglio teve início com a pré-campanha de Wellington Lucas Barroso, o “Mucuri”, presidente estadual da Juventude do PSDB e pré-candidato a vereador em Contagem, que mesmo com a sinalização de apoio dos tucanos a Marília, vinha fazendo críticas à gestão petista em suas redes sociais.
As manifestações contrárias de Mucuri, que ocupa espaços de destaque no partido, geraram dúvidas sobre o real posicionamento do PSDB em relação à prefeita. Diante disso, interlocutores de Marília Campos procuraram o deputado estadual João Vítor Xavier (Cidadania), partido que integra a federação com o PSDB, para sondar se os tucanos realmente participariam da coligação.
Em uma reunião em 24 de maio, Abi-Ackel deu um “puxão de orelha” nos tucanos locais, reiterando o compromisso do partido com a campanha da petista.