O advogado da Associação dos Familiares das Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem em Brumadinho (Avabrum), Danilo Chammas, destacou nesta quinta-feira (19) a importância histórica da decisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que condenou o ex-diretor de Ferrosos da Vale, Gerd Peter Poppinga, ao pagamento de multa de R$ 27 milhões.
“Pela primeira vez, uma pessoa física é responsabilizada após as duas grandes tragédias recorrentes em Minas Gerais. É um julgamento que reconhece um problema grave na gestão da companhia”, afirma Chammas, referindo-se aos desastres de Mariana (2015) e Brumadinho (2019).
O advogado, no entanto, questiona a ausência de processo criminal contra Poppinga. “Salta aos olhos o fato de que a única pessoa física responsabilizada até hoje não esteja respondendo pelos homicídios e pelos outros crimes no âmbito da justiça criminal”, ressalta.
A decisão da CVM, tomada por três votos a um, baseou-se em violações ao dever de diligência previsto na Lei das Sociedades por Ações. O relator Daniel Maeda apontou que ao menos dez funcionários da Diretoria de Ferrosos tinham conhecimento dos riscos da Barragem B1.
Chammas relembra que em 2020 o Ministério Público Federal propôs uma ação civil pública pedindo intervenção judicial na Vale. “A decisão de hoje reforça que o MPF tinha razão naquela época, ao apontar que vigora na Vale um verdadeiro sistema de irresponsabilidade corporativa”, cita o advogado.
Sobre a absolvição do ex-presidente da Vale, Fabio Schvartsman, o representante da Avabrum manifesta discordância. “Lamentamos que o então presidente tenha sido absolvido. No âmbito criminal, estamos de acordo com o entendimento que o levou a ser réu nos processos por homicídios dolosos e crimes ambientais”, declara.
O advogado também critica a natureza da punição aplicada a Poppinga. “Entre diferentes possibilidades de pena, foi aplicada somente a pena pecuniária. A legislação prevê inabilitação temporária de até 20 anos para exercício de cargo de administrador, o que poderia ter sido cogitado considerando a gravidade das consequências”, explica.
Chammas menciona que a ação civil pública do MPF apontava um “sistema de irresponsabilidade corporativa” na Vale. “De acordo com os procuradores, no âmbito da própria direção executiva, havia um comando no sentido de acolher práticas inseguras e, ao mesmo tempo, um sistema que pudesse livrar as pessoas da responsabilidade pelas consequências”, argumenta.
A Avabrum também protestou contra a forma como o julgamento foi comunicado. “Lamentamos ter sido comunicados sobre o agendamento da continuidade do julgamento com menos de 24 horas de antecedência. Isso impossibilitou totalmente o deslocamento de pessoas de Minas Gerais para o Rio de Janeiro”, relata o advogado.
O caso, que começou a ser julgado em outubro, foi finalizado após um pedido de vista. A defesa de Poppinga argumentou que a Vale possuía estrutura robusta de governança e que ele confiava nas informações das áreas técnicas. Já na absolvição de Schvartsman, pesou o fato de ele ter assumido a presidência em 2017 sem experiência prévia no setor.
O rompimento da barragem B1, em 25 de janeiro de 2019, causou 270 mortes e extensos danos ambientais na região de Brumadinho. Foi o segundo grande desastre envolvendo uma barragem da Vale em menos de quatro anos, após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana.