Os ossos descobertos na vala clandestina de Perus, no Cemitério Dom Bosco, em São Paulo, foram tratados com negligência pela UFMG, que nos anos 90 recebeu a missão de identificá-los.
A afirmação é do próprio Ministério dos Direitos Humanos. O episódio inspirou o Ministério Público Federal em São Paulo a promover em 2009 uma ação civil pública contra a universidade e outras pessoas e instituições, ainda sem desfecho.
Nesta segunda (24), a ministra Macaé Evaristo, que é mineira, pediu desculpas em nome do Estado brasileiro aos familiares dos desaparecidos políticos durante a ditadura militar “pela negligência, entre 1990 e 2014, na condução dos trabalhos de identificação das ossadas encontradas” na vala clandestina.
Em seu discurso, a ministra citou a UFMG duas vezes.
Foram retirados da vala, disse a ministra, “1.052 conjuntos ósseos que foram inicialmente levados à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e encaminhados também para a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)”.
“Em virtude das diversas denúncias relacionadas às condições precárias de armazenamento dos remanescentes”, acrescentou, “estes foram removidos e realocados no Instituto Médico Legal do Estado de São Paulo”.
A ação civil pública, em 2009, pediu a condenação da UFMG e da professora Vânia Ferreira Prado, entre outras pessoas e instituições. A professora hoje trabalha em uma universidade no Canadá e não respondeu às perguntas de O Fator.
No relato dos procuradores, “amostras das ossadas pendentes de identificação e com alguma chance de pertencerem a desaparecidos políticos estavam na Universidade de Belo Horizonte – UFMG – para a realização de exame de DNA”, por causa de uma colaboração ou convênio entre a UFMG e a Unicamp.
Porém, “as amostras de ossadas e de sangue de familiares também ficaram esquecidas na UFMG” – por cerca de cinco anos, até o ano 2000.
Os procuradores acrescentaram: “Médicos e cientistas da UFMG, que deveriam saber a forma correta de armazenamento e conservação desse tipo de material, deram ao sangue das mães e irmãos de mortos e desaparecidos políticos um tratamento que praticamente inviabilizou seu aproveitamento. É manifesta a negligência”.
O MPF em São Paulo disse a O Fator que a ação “está em fase de conciliação entre as partes”.
A UFMG não respondeu às nossas perguntas.
Na sexta passada (21), O Fator revelou que a UFMG foi condenada em 1ª instância na Justiça Federal a ressarcir a construtora JRN, sediada em Contagem, por prejuízos na construção do Memorial da Anistia, que permanece inacabado. A universidade recorreu em 2021 e o caso ainda não tem uma decisão final.
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