Estão previstas para os dias 6, 7 e 8 de agosto, em Brasília, as próximas reuniões para tratar da repactuação de Mariana. O encontro deve promover algumas novidades no âmbito da negociação, que não terá mais o desembargador Ricardo Machado Rabelo, do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), como mediador – Rabelo foi eleito vice-presidente do TRF e toma posse no cargo já no final de julho. O nome do novo mediador do caso, que será responsável também pela homologação do acordo, quando e se houver, ainda não foi definido.
Além da mudança de mediador, o encontro deve acontecer com alguns entraves à mesa: havia expectativa entre os negociadores de que a rodada de negociação do início deste mês, tida como “decisiva” por muitos, já encaminhasse um acordo ainda em julho. Apesar da tentativa, as conversas não avançaram tanto.
O Fator apurou que, para as reuniões de agosto, a negociação da repactuação chega com três principais pendências:
- Criação de fundo de indenização para mulheres atingidas: O tema é relacionado à ação do MPF feita em junho, em que pede o pagamento de indenização mínima de R$ 135 mil para cada mulher atingida, por danos materiais, e de pelo menos R$ 36 mil por danos morais sofridos. A ação também pede R$ 3,6 bilhões por danos morais coletivos gerados).
- Gerenciamento de Áreas Contaminadas (GAC): Trata-se de como ficarão as responsabilidades das empresas e do Estado nas ações de recuperação e preservação das áreas do Rio Doce. Por exemplo, se os rejeitos serão ou não retirados, e quem determinaria essa quantidade e quando. O poder público defende que os órgãos ambientais, como o Ibama, façam isso. As empresas discordam e defendem a não retirada do rejeito.
- Nova porta de indenizações: As empresas defendem o encerramento das portas indenizatórias com data de corte pretérita – PIM, AFE, Novel e afins. O poder público tenta, ainda, rever e manter algumas condições.
Os valores do acordo ainda são negociados, embora não sejam mais o principal entrave. Na última proposta feita pelas mineradoras, no início de junho, houve a oferta de pouco mais de R$ 82 bilhões de “dinheiro novo” – sendo R$ 140 bilhões somando, inclusive, o que já foi gasto com a Fundação Renova.
A União ainda tenta crescer o valor de dinheiro novo na negociação – cerca de R$ 5 a R$ 8 bilhões a mais.
A propósito, o destino da Fundação Renova é um dos pontos já pacificados entre os negociadores. O acordo, se fechado, deve prever o fechamento quase total da entidade, com exceção de projetos que façam o atendimento da população (por exemplo, com o fornecimento de água em regiões muito afetadas pela contaminação do rio). Esses projetos funcionariam até a substituição por ação estatal.
Em junho, O Fator teve acesso a detalhes da última proposta das mineradoras na negociação. Desde então, o poder público pediu alterações e reuniões foram feitas, mas ainda sem novas ofertas.
Detalhamento da Proposta de junho:
Obrigações de Pagar: R$ 82 bilhões
A proposta inclui R$ 82 bilhões em obrigações de pagar ao Poder Público a serem desembolsados ao longo de 20 anos. Estes pagamentos serão feitos em parcelas anuais, iguais e sucessivas, corrigidas pelo IPCA. Deste montante:
- Aproximadamente 70% (cerca de R$ 57,4 bilhões) será destinado a beneficiar diretamente as pessoas da região afetada, através de programas como:
• Programa de transferência de renda para os mais vulneráveis
• Fortalecimento do sistema de saúde local com a criação de um fundo perpétuo
• Universalização do saneamento na Bacia do Rio Doce
• Programa coletivo para Povos e Comunidades Tradicionais elegíveis
• Repasse direto aos Municípios
• Fundo de resposta a enchentes
• Fundo para deliberação direta das comunidades
• Assessoria Técnica Independente
• Fortalecimento do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)
• Investimento nas rodovias da região - Os 30% restantes (cerca de R$ 24,6 bilhões) serão dedicados a outros programas socioambientais geridos pela União e Estados, incluindo iniciativas de desenvolvimento rural, resposta a desastres, adequação às mudanças climáticas, fiscalização de barragens, educação ambiental, cultura e turismo, prevenção à violência doméstica, apoio a microempreendedores e fomento ao crédito rural.
Obrigações de Fazer: R$ 21 bilhões
A Samarco permanecerá responsável por obrigações de fazer estimadas em R$ 21 bilhões. Deste valor:
- 60% (aproximadamente R$ 12,6 bilhões) beneficiará diretamente as pessoas da região, incluindo:
• Soluções indenizatórias definitivas para pessoas elegíveis
• Conclusão dos reassentamentos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo - Os 40% restantes (cerca de R$ 8,4 bilhões) serão destinados a benefícios ambientais diretos, como:
• Recuperação de 5 mil nascentes
• Reflorestamento de mais de 40 mil hectares (equivalente a 28 mil campos de futebol)
Valores já investidos: R$ 37 bilhões
A proposta reconhece os R$ 37 bilhões já investidos pela Fundação Renova em medidas de reparação e remediação, dos quais:
- Segundo as empresas, pelo menos R$ 17 bilhões já beneficiaram diretamente mais de 430 mil pessoas através de indenizações e assistências financeiras.
Condições e Observações Importantes:
- Segundo as mineradoras, o aumento da proposta está condicionado a termos, incluindo:
• Inexigibilidade de gerenciamento de área contaminada
• Levantamento da restrição à pesca
• Encerramento das portas indenizatórias com data de corte pretérita (PIM, AFE, Novel e afins) - A proposta é não vinculante, confidencial e sujeita a aprovações societárias.
- As empresas ressaltam que a oferta busca atender aos principais pleitos do Poder Público, visando a pacificação social e segurança jurídica.
- A proposta é válida apenas no contexto da mediação conduzida pelo TRF-6 e não pode ser usada contra as empresas para fins litigiosos.
A proposta foi enviada ao Tribunal Regional Federal da 6ª Região em 11 de junho.
A barragem de Fundão se rompeu em novembro de 2015, matando 19 pessoas e gerando dano ambiental ainda incalculável. A estrutura era administrada pela Samarco, mineradora controlada pela Vale e pela BHP Billiton.