O cálculo financeiro — e político — por trás das críticas de Zema a vetos de Lula ao Propag

Trechos barrados pelo presidente vão, segundo o governo de Minas, aumentar desembolsos previstos para os próximos dois anos
O governador Romeu Zema
Zema subiu tom contra vetos de Lula a trechos do Propag. Foto: André Cruz/Digital MG

A insatisfação do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), com vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a trechos do Programa de Pleno Pagamento das Dívidas dos Estados (Propag) está relacionada, sobretudo, à decisão do Palácio do Planalto de barrar mecanismos que diminuiriam os valores pagos pelo governo mineiro neste ano e em 2026. Segundo apurou O Fator, nas contas do Palácio Tiradentes, se houvesse Propag nos moldes aprovados pelo Congresso Nacional em dezembro, Minas pagaria R$ 4,1 bilhões em 2025. No modelo sancionado, as cifras subiriam para R$ 7,3 bilhões.

No governo mineiro, a principal insatisfação acontece por causa do veto a um mecanismo à decisão do Palácio do Planalto de barrar um mecanismo que possibilitava o repasse, à União, da tarefa de pagar débitos do estado com mecanismos internacionais, como os bancos multilaterais de desenvolvimento. Nesta quarta-feira (15), em coletiva de imprensa, Zema chegou a afirmar que, sem a derrubada dos vetos, Minas não vai aderir ao Propag.

No Regime de Recuperação Fiscal (RRF), programa que Zema tem seguido desde outubro para amortizar a dívida, o Executivo federal quita passivos internacionais de Minas e os valores são acrescidos ao total do débito com o Planalto. A “transferência” da dívida estava presente na versão do Propag que recebeu aval do Legislativo, mas acabou vetada.

Sem os vetos, a equipe econômica de Zema estimava que a parcela de 2026 do novo plano de refinanciamento seria de cerca de R$ 5,8 bilhões. Na redação publicada por Lula, o valor sobe para R$ 8,1 bilhões.

A diferença dos os valores projetados para este ano e 2026 para as cifras calculadas a partir dos vetos se aproxima de R$ 5 bilhões, montante citado por Zema em uma publicação feita na rede social “X” para criticar a versão do programa de amortização aprovada pelo governo federal.

“O governo federal quer que os estados paguem a conta de sua gastança. Com vetos ao Propag, Lula quer obrigar os mineiros a repassar R$ 5 bi a mais em 25/26, apesar do recorde de arrecadação federal: R$ 2,4 trilhões em 2024. É dinheiro para sustentar privilégios e mordomias”, escreveu, sem citar publicamente os vetos tidos como indigestos.

O entendimento é de que o veto ao trecho que tratava das dívidas contraídas com organismos estrangeiros possa ser derrubado pelo Congresso, uma vez que o tema afeta diferentes estados.

Lei de Responsabilidade Fiscal preocupa 

Lula também vetou um artigo que dava, aos estados optantes pelo Propag, espaço para adequação aos limites de gastos com pessoal impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Os governos locais que gastam mais de 49% da receita corrente líquida com a folha de pagamento teriam dois quadrimestres para regularizar a situação, sob pena de perder aportes federais. Minas, vale lembrar, ultrapassou esse limite recentemente e gasta cerca de 50% da receita com essa rubrica.

Nos bastidores do governo, o veto é interpretado como prejudicial sobretudo a curto prazo, por limitar eventuais movimentos do Executivo para valorizar financeiramente os servidores.

“Em que pese a boa intenção do legislador, o dispositivo contraria o interesse público e incorre em vício de inconstitucionalidade ao desobrigar o Estado de cumprir as restrições previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal, em caso de violação aos limites de despesas de pessoal, e ao permitir que a União efetue o pagamento das prestações das dívidas dos Estados e incorpore-o ao seu saldo devedor, o que ampliaria o impacto fiscal do Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados – Propag para a União”, escreveu Lula, ao vetar os trechos relacionados à LRF.

Dúvida sobre FNDR é incômodo menor

A sanção de Lula ao Propag também não contempla artigo que autorizava o uso do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) para diminuir o volume dos passivos. Segundo o presidente, o uso do FNDR para esse fim violaria a Constituição Federal. A poupança foi criada a reboque da reforma tributária.

Embora Minas Gerais se oponha à decisão do presidente de barrar o uso do FNDR, o entendimento é que esse veto tem impacto menor nos cálculos feitos pelo estado para a adesão ao Propag. Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, outros estados devedores, por seu turno, devem ter mais prejuízos.

O FNDR consta no texto da reforma tributária como uma espécie de alívio financeiro aos estados, que não poderão recorrer a benefícios fiscais para atrair investimentos. O primeiro aporte da União na poupança, previsto para 2029, será de R$ 8 bilhões. A expectativa é que a injeção chegue a R$ 60 bilhões na década de 2040.

Tetos distintos

A dívida de Minas já chegou a cerca de R$ 165 bilhões. Por causa do acordo para a entrada no RRF, apenas em janeiro deste ano, R$ 303,7 bilhões foram enviados à União. O regime também impõe um teto de gastos que limita o crescimento das despesas primárias à variação da inflação.

O Propag, contudo, tem um teto de gastos tido como mais vantajoso. Se as receitas primárias do estado não crescerem no ano anterior, as despesas só poderão aumentar conforme a variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). 

Caso seja apurado resultado primário nulo ou negativo, as despesas poderão crescer conforme o IPCA acrescido de 50% da variação real positiva da receita primária apurada.

Em outro cenário, quando for detectado resultado primário positivo, as despesas poderão crescer com base em uma fórmula que considera a flutuação inflacionária mais 70% da variação real positiva da receita primária apurada.

Em tese, Minas pode aderir ao novo teto com a entrada no Propag. Interlocutores do governo Zema, entretanto, temem que isso não se concretize por causa da exclusão, do texto sancionado, de um inciso que dispensava participantes do RRF de comprovarem o “cumprimento de metas” ligadas ao refinanciamento da dívida.

Defesa de Pacheco

As críticas de Zema à nova versão do Propag deflagraram uma discordância entre o político do Novo e o presidente do Congresso Nacional, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), autor da versão original da proposta. 

 “O momento é de agradecer ao presidente Lula pela sanção do Propag e aproveitar a oportunidade que os estados terão para equacionar um problema histórico”, disse.

Em que pese os vetos, o cerne do programa de refinanciamento está mantido. Assim, governos locais poderão repassar ativos estaduais à União como forma de amortização dos passivos. No caso de Minas, seria possível, por exemplo, a federalização de estatais. 

As federalizações são gatilhos para diminuir o indexador das dívidas. Atualmente, as dívidas são calculadas por uma fórmula que considera o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) + 4%. A título de exemplo, nos termos da proposta de Pacheco, governos locais que diminuírem ao menos 20% de seus passivos por meio do repasse de bens à União poderão utilizar uma taxa de juros anual baseada em IPCA + 2%.

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