Interlocutores do Judiciário, da Defensoria Pública, do Tribunal de Contas do Estado e do Ministério Público Estadual pressionam, desde a noite da última quarta-feira (28), o presidente da Assembleia, deputado Tadeu Martins Leite (MDB), a pautar o projeto de resolução que susta, ou seja, cancela os efeitos do decreto que estabelece um teto de gastos no Estado, feito por Romeu Zema (Novo) também na quarta.
O projeto foi protocolado por nove deputados do bloco de oposição a Zema na Assembleia. Segundo o texto dos parlamentares, a criação de um mecanismo para limitar o crescimento das despesas públicas deve ser feita por meio de um projeto de lei complementar (PLC) — e não amparado por um decreto.
Dentro da Assembleia, havia expectativa de que a Secretaria-Geral da Mesa comunicasse aos deputados, ainda nesta sexta-feira (30). a formalização da inclusão do projeto na pauta da próxima semana, o que acabou não ocorrendo. Pelo que O Fator apurou, lideranças ainda aguardam entendimentos para deliberar.
A pressão ao presidente do Legislativo é efeito do péssimo clima instaurado entre os Poderes mineiros desde a publicação do decreto que estabelece o teto de gastos. Na avaliação de fontes ligadas ao Judiciário e às instituições, o teto foi criado sem uma discussão maior com o restante dos interlocutores – houve reclamação de que Zema não chegou a sinalizar ao TJ e à Assembleia, por exemplo, que publicaria a medida assim que o STF reconhecesse o acordo feito entre o Estado a União no âmbito da discussão da dívida mineira.
“Aconteceram reuniões entre os chefes de Poder para discutir Orçamento e não houve sinalização do teto de gastos nas últimas conversas”, diz uma pessoa ligada à discussão. Segundo essa fonte, só o TJ, por exemplo, tem enfrentado questões de readequação nas finanças e, por conta disso, possui hoje 125 comarcas sem juiz.
O teto de gastos é condicionante para a adesão de Minas Gerais ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), que vai acontecer mesmo sem o aval da Assembleia Legislativa porque Palácio Tiradentes e União chegaram a um acordo. O estado vai ingressar no RRF para retomar, a partir de outubro, os pagamentos da dívida de R$ 165 bilhões com o governo federal.
Na avaliação do governo, o tema, por ainda ser recente e sem muitos precedentes, demanda cautela. Há o temor, por exemplo, de que se o decreto do teto de gastos for revogado, o acordo feito com a União seja, em consequência, retirado.
Um ponto avaliado dentro da Assembleia seria o de revogar o teto de gastos até o prazo de seis meses dado pelo ministro Nunes Marques, do STF, para que o Estado implemente as medidas estruturantes pendentes e apresentar um cronograma de cumprimento dos requisitos do RRF. Nesse intervalo, a aposta de deputados é que o Congresso termine de analisar e votar o projeto que cria o Programa de Pleno Pagamento das Dívidas dos Estados (Propag), apresentado pelo presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
“Esperamos que nesse período (os seis meses) o Propag, que é uma alternativa muito mais eficaz e menos danosa que o RRF, possa se viabilizar. Assim, poderemos construir uma solução definitiva ao endividamento do Estado”, disse Tadeu Martins Leite, ao anunciar a saída da Recuperação Fiscal da pauta de votações, na quarta-feira.
Neste ponto, a avaliação de assessores de Zema é que a Câmara dos Deputados, pelo menos até o momento, não sinalizou qualquer interesse em dar celeridade à tramitação do Propag.
Timing delicado
Se a pressão de outras instituições é grande, há outro problema a ser encarado: o timing em que a nova crise acontece. Com o início das eleições municipais, a maior parte dos deputados da ALMG tem se concentrado no apoio às candidaturas em suas bases pelo interior do Estado. Ou seja, para sustar o decreto, não será fácil reunir quórum ou a quantidade necessária de votos para aprovar um recuo no decreto.
O projeto que susta o decreto de Zema é assinado pelas deputadas Lohanna França (PV), Andréia de Jesus (PT), Beatriz Cerqueira (PT), Bella Gonçalves (Psol) e Leninha (PT). Também subscrevem o texto os deputados Betão (PT), Doutor Jean Freire (PT), Professor Cleiton (PV) e Ricardo Campos (PT).
Entenda o teto de gastos
O teto de gastos determina que o crescimento anual das despesas do estado fica limitado à variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Na prática, os empenhos não poderão ultrapassar a inflação. A “trava” na elevação das despesas é uma contrapartida para a adesão à Recuperação Fiscal.
O exercício de 2023 será a base para o cálculo do limite para o crescimento das despesas públicas. Há, entretanto, exceções para o cumprimento da regra, como os repasses financeiros constitucionais feitos às prefeituras.
O acordo entre a Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais (AGE-MG) e a Advocacia-Geral da União (AGU) tem 1° de agosto como data retroativa para a adesão ao RRF. Assim, as parcelas da dívida voltariam a ser pagas em 1° de outubro. As condições ainda precisam ser homologadas pelo ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF).