Pela liberdade nas relações trabalhistas: a nova jabuticaba brasileira

Em vez de avanços, nos afundamos em políticas que ignoram as reais demandas econômicas, condenando o país a mais estagnação
Foto mostra carteira de trabalho
PEC do fim da escala 6x1 ainda não começou a tramitar no Congresso. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O Brasil, mais uma vez, encontra-se diante de um cenário onde o governo recorre a intervenções estatais para tentar contornar a insatisfação popular e desviar o foco da crise fiscal que assola o país. Com o Governo Lula III lutando para manter sua popularidade, a proposta da deputada socialista Erika Hilton, de extinguir a jornada 6×1, aparece como uma estratégia populista, um balão de ensaio para apaziguar a esquerda e sugerir uma suposta proteção aos trabalhadores. A medida, entretanto, mascara uma realidade dura: o Brasil enfrenta uma crise econômica profunda, e o governo se vê “nas cordas”, tentando reverter a discussão com uma intervenção que ignora os impactos sobre os pequenos negócios e a produtividade.

Em coluna publicada neste O Fator, no dia 02 de setembro deste ano, trouxe a visão de Frédéric Bastiat acerca dos efeitos nocivos de intervenções estatais na economia , em “O que se vê e o que não se vê”. O filósofo francês, nascido no século XIX, já alertava sobre os riscos das políticas que apenas aparentam resolver problemas de maneira imediata, mas que, ao final, geram consequências negativas e invisíveis.

Essa nova proposta é um claro exemplo de interferência desnecessária nas relações privadas de trabalho, que ignora o papel essencial dos pequenos negócios e MEIs, responsáveis por uma parcela significativa dos empregos formais no país. Segundo dados do Sebrae, esses pequenos negócios respondem por cerca de 70% dos postos de trabalho no Brasil, e o salário médio dos proprietários fica em torno de R$ 2.500 mensais, refletindo o ambiente difícil em que esses empreendedores sobrevivem. Ao impor mais rigidez nas relações trabalhistas, o governo inviabiliza ainda mais a sobrevivência desses negócios.

Pior do que está, fica

A crise de produtividade brasileira é um capítulo à parte. Nos últimos 50 anos, o país praticamente não avançou em produtividade, ao contrário de países como China e Coreia do Sul, que cresceram de forma consistente. Dados recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) apontam que a produtividade do trabalhador brasileiro representa menos de um quinto da produtividade de um trabalhador americano. Enquanto outras nações conquistam riqueza com trabalho e inovação, o Brasil opta por políticas paliativas que apenas mascaram a falta de competitividade. Insistir em políticas de países ricos, sem antes resolver nossas deficiências básicas, é um erro grave que nos mantém presos ao subdesenvolvimento.

O impacto de uma medida dessas nas contas públicas e no mercado de trabalho é outro ponto alarmante. A imposição de uma jornada 4×3 pode levar a um aumento no custo trabalhista, pressionando os pequenos negócios e até incentivando demissões em massa. Exemplos como a PEC das domésticas demonstram o efeito nocivo de políticas intervencionistas: desde a regulamentação, houve uma migração significativa para a informalidade nesse setor. O risco é que essa mesma situação se repita, resultando em mais desemprego e menos carteira assinada, enfraquecendo ainda mais a economia formal e elevando o risco Brasil, o que afasta investimentos e encarece o crédito.

A verdade é que os problemas reais do Brasil vão muito além da jornada 6×1. Temos um custo trabalhista elevadíssimo, uma carga tributária sufocante, gastos excessivos com a máquina pública, baixa qualidade educacional, insuficiência de investimentos em infraestrutura e uma insegurança jurídica que afugenta investidores. Dados do Banco Mundial mostram que o Brasil é um dos países com maior carga tributária do mundo em relação ao PIB, e que o custo para fazer negócios aqui supera o de diversas nações latino-americanas. Enquanto os governantes ignoram esses problemas, a economia segue fragilizada, sem perspectivas de crescimento sustentável.

Melhor qualificação

A solução para as relações trabalhistas no Brasil não está em uma maior intervenção estatal, mas sim em uma flexibilização que permita uma relação mais livre entre empregadores e empregados. Reduzir o custo para contratar e demitir não só permitiria uma adaptação mais eficiente às necessidades de mercado, como também aumentaria a competitividade e a geração de riqueza. A economia é guiada por relações espontâneas entre os agentes; criar riqueza é um processo que não pode ser artificialmente imposto por desejo estatal. A interferência excessiva distorce as condições naturais e leva a um desequilíbrio que prejudica a todos.

O que a maioria das pessoas ainda não compreende, é a relação produtividade x bem-estar social. Os ganhos de produtividade têm historicamente contribuído para a melhoria da qualidade de vida, proporcionando mais tempo para descanso e lazer. Esse aumento de produtividade, além de gerar maior renda, possibilita que o tempo de trabalho seja reduzido, favorecendo o ócio criativo e momentos de descontração. A humanidade só alcançou essa posição por meio de inovações, da elevação dos níveis de escolaridade e da automatização de serviços, todos elementos que modificaram profundamente o mercado de trabalho. Hoje, as mudanças nesse mercado ocorrem em uma velocidade sem precedentes, e estamos inseridos em um novo contexto econômico.

Além disso, a busca constante das empresas para reduzir custos, mitigar riscos trabalhistas, automatizar processos e aprimorar o relacionamento com os clientes, somada à inserção cada vez mais intensa da inteligência artificial, coloca o trabalhador menos qualificado em uma posição vulnerável. A tecnologia não só redefine as demandas do mercado como também impõe desafios à força de trabalho. Em um cenário onde diversos negócios podem ser obrigados a aumentar suas equipes e, consequentemente, seus custos, a tendência é que muitos optem por ferramentas digitais e pela automação para substituir a mão de obra.

Efeitos colaterais

Esse processo, além de ser uma medida de contenção de custos, acaba acelerando a substituição de funções tradicionais e menos qualificadas por alternativas digitais. Essas transformações não são apenas uma reação às necessidades imediatas, mas um reflexo da transição para um modelo econômico mais dinâmico e automatizado. Impor por vias estatais mais um elemento de restrição ao mercado de trabalho, poderá acelerar ainda mais este processo, que já é inevitável.

Os efeitos de uma política como essa são previsíveis: mais desemprego, aumento da informalidade, diminuição dos investimentos, especialmente para os pequenos negócios, e redução da massa salarial. Além disso, cria-se um mercado de trabalho desbalanceado, onde pequenos e grandes negócios enfrentam custos desproporcionais. Em vez de proteger o trabalhador, essas medidas geram um cenário de escassez e insegurança. Ainda, pode-se citar, mais problemas previdenciários e mais inflação.

Outro efeito pouco considerado é a possível diminuição da concorrência e a concentração de renda. Grandes corporações já adotam, em sua grande maioria, uma carga mais reduzida de trabalho, em contrapartida, pequenos negócios, especialmente o MEI, estão mais sujeitos a carga mais intensa. Os grandes vencedores desta medida não seriam os trabalhadores que, atualmente, estão sujeitos a uma escala 6×1, mas sim trabalhadores mais qualificados e que já possuem maior flexibilidade de trabalho.

Encerrando

Por último, algumas indagações: O trabalhador aceitará, mesmo, trabalhando menos ter redução salarial? O empregador aceitará pagar o mesmo por uma carga reduzida? Caso o empregador tenha uma necessidade real de continuar operando 6×1, o empregado adicional aceitará trabalhar 2×5? O empregado, que em tese, terá mais tempo de descanso, não optará por continuar trabalhando em outro empreendimento no seu novo período de descanso? Os consumidores ficarão satisfeitos com essa medida?

Essa proposta é mais uma jabuticaba populista, uma ideia tipicamente brasileira que visa acalmar o público, mas que é irresponsável e prejudicial, especialmente para os trabalhadores menos qualificados. Em vez de avanços, nos afundamos em políticas que ignoram as reais demandas econômicas, condenando o país a mais uma década de estagnação e incertezas.

Leia também:

A quadrilha que causou ‘tensão’ entre um deputado e a Polícia Legislativa da ALMG

Prefeito acusa Samarco de descumprir prazos para obras corretivas no entorno de Candonga

Os dados alarmantes do relatório final de fiscalização do TCE em unidades de saúde de MG

Veja os Stories em @OFatorOficial. Acesse