Como PL do governo Lula atende ao lobby da Uber – e desagrada todo o resto

Em audiência na Câmara, procurador do Trabalho, concorrente da Uber e motorista criticaram projeto por motivos diferentes
Lula na cerimônia do PLC do Uber
Lula, entre Silvia Penna, do Uber; e Fernando Paes, da 99: lobby bem-sucedido. Foto: Ricardo Stuckert/PR

Uma audiência pública na Câmara na quarta-feira passada (8) deixou bem claro como o projeto de lei para motoristas de aplicativo, apresentado pelo governo Lula no começo de março, atende completamente aos interesses da Uber e da 99 – e desagrada aos motoristas, aos concorrentes e à procuradoria do Trabalho.

O procurador do Trabalho Renan Bernardi Kalil chamou a atenção para o fato de que o Artigo 5º do texto impede preventivamente qualquer reconhecimento de relação trabalhista – na contramão das legislações recentemente aprovadas no Chile, Espanha e Portugal sobre o mesmo assunto.

Se adotado, o projeto vai sacramentar em lei que as plataformas podem tratar os motoristas como “frilas”, ou algo bem próximo disso, mesmo adotando uma série de regras típicas da relação entre patrão e empregado.

O texto também reconhece as plataformas como empresas de tecnologia, embora 99 e Uber sejam registradas no Inpi como empresas de transporte – sua real atividade, no entender do procurador.

Carlos Nishikawa, representante da inDrive – concorrente da Uber – criticou o projeto por outros motivos.

“Esse PLP 12 foi moldado para empresas que têm margens altas de comissão”, disse Nishikawa.

Isso acontece porque a contribuição à Previdência prevista no texto é uma porcentagem “sobre o valor total dos salários-de-contribuição daqueles trabalhadores”, ou seja, é baseada em quanto a plataforma paga ao motorista.

Portanto, o projeto “tem uma lógica inversa sobre o impacto da contribuição do INSS por parte da empresa (…) Quanto maior a comissão da empresa, menor será a contribuição do INSS pro governo”.

Assim, “o PLP 12 incentiva a empresa a aumentar a comissão para pagar menos INSS. Porque a base de cálculo está sobre o ganho do motorista”. A lógica favorece empresas como a Uber e prejudica as que cobram menos comissão dos motoristas ou adotam outros modelos.

Já Lucas Dias – motorista de Uber – reclamou que o projeto não contempla demandas como pagamento mínimo por quilômetro e segurança do motorista. Até 2019, disse ele, os motoristas eram pagos por quilômetro rodado, mas as empresas abandonaram essa prática. “É ridículo que nós, consumidores, motoristas de aplicativos, tenhamos que pegar corridas que paguem R$ 1,09, cara, por quilômetro”, disse ele, dirigindo-se diretamente a André Porto, da Amobitec, que reúne empresas como Uber e 99.

Não foi à toa que a Uber celebrou o projeto do governo Lula, que chamou de “importante marco”.

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