MP instaura inquérito para investigar ‘IPTU ilegal’ em Contagem

Cobrança, referente ao ano de 2017, foi apontada como irregular pelo STF em recente decisão
Ex-prefeito pode ser responsabilizado por cobrança irregular | Credito: Elias Ramos - Divulgação PMC

O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) instaurou um inquérito civil para investigar possíveis irregularidades na cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) por parte da Prefeitura de Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), em 2017. A ação foi proposta pelo promotor de Justiça Fábio Reis de Nazareth, que repercute uma recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que apontou ilegalidades na cobrança do tributo referente àquele ano.

A O Fator, Nazareth disse que a finalidade do inquérito é propor à Prefeitura de Contagem o reconhecimento espontâneo dessa decisão do Supremo, que inicialmente só se limita aos autores de uma ação movida pelo Movimento Libertas Minas, coletivo social de Contagem que se formou após a retomada da cobrança do imposto.

“A prefeitura em si não teria a obrigação de estender os efeitos dessa decisão para todos os demais contribuintes. Instaurei esse inquérito civil para ver se conseguimos, de forma consensual, que a prefeitura estenda esses efeitos e reconheça a nulidade do lançamento dos IPTUs do ano de 2017”, afirmou.

Com a decisão do STF, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) teve de rever uma sentença anterior, que pedia o reconhecimento da irregularidade da cobrança. A ação apontava que a cobrança feria o preceito da “Anterioridade Nonagesimal” — que determina que um tributo só pode ser cobrado três meses após a publicação da lei que o criou ou aumentou seus valores

Com o reconhecimento da nulidade do tributo, o promotor explica que será possível anular todos os lançamentos feitos, cancelando débitos ainda pendentes, retirando nomes em dívida ativa, protestos em cartório e eventualmente até execuções fiscais.

“Caso esses lançamentos fossem cancelados, o contribuinte não estaria mais sujeito a essas sanções”, explicou.

Segundo Fábio Nazareth, outra possibilidade seria o contribuinte reaver o pagamento relativo ao ano de 2017 sem ter de exigir a devolução das cifras.

“As alternativas são duas, basicamente: ou a prefeitura, por meio de lei, cria um mecanismo para compensação ou outra forma de devolução desse valor ao contribuinte, ou o contribuinte propõe a ação judicial nos casos em que seria cabível”.

Sobre a decisão do Supremo, da quebra do princípio da “anterioridade nonagesimal”, o promotor conta que advertiu a prefeitura, à época comandada por Alex de Freitas (eleito pelo PSDB, mas agora filiado ao Avante), de que estava havendo uma ilegalidade. “Cheguei a propor uma ação civil pública, mas por razões processuais ela não avançou”.

A Prefeitura de Contagem, porém, se amparava em um parecer do Ministério Público de Contas (MPC) que garantia a legalidade da cobrança do IPTU em 2017.

Medidas propostas pelo inquérito

No inquérito, o promotor Fábio Nazareth determinou uma série de medidas, incluindo:

  • A notificação do representante (Movimento Libertas Minas) e do representado (Prefeitura Municipal de Contagem) sobre a instauração do inquérito.
  • A notificação da Procuradoria Geral do Município (PGM) para se manifestar sobre a possibilidade de um acordo para regularizar as cobranças judiciais e extrajudiciais relativas ao período de 2017, bem como sobre a eventual anulação de créditos tributários inseridos em dívida ativa.

Ex-prefeito pode ser responsabilizado por cobrança irregular

Ainda segundo Nazareth, o inquérito civil pode analisar uma eventual responsabilidade de Alex de Freitas pela cobrança da taxa.

“Eu e o Ministério Público o advertimos da ilegalidade que estava sendo praticada. Ele estava embasado no estudo que a sua equipe técnica realizou. Mas havia uma manifestação clara do MP de Contagem de que havia uma ilegalidade que geraria o que está para acontecer agora: a responsabilização do município e da prefeitura para o ressarcimento desse dano moral coletivo que atende a todas as pessoas da cidade”, apontou.

Em resposta a O Fator, Alex de Freitas informou que, por orientação de sua assessoria jurídica, não faz comentários sobre investigações em andamento.

“Ressalto, ainda, que tenho plena confiança na seriedade do trabalho do Ministério Público e, caso seja intimado, prestarei os meus esclarecimentos a tempo e modo no intuito de contribuir com a elucidação do caso”, garantiu.

Prefeitura se manifesta

Já a Prefeitura de Contagem destacou que o procedimento foi recentemente instaurado e que o município ainda não teve oportunidade de manifestar e apresentar suas considerações e fundamentos no procedimento. Leia, abaixo, a íntegra da nota da prefeitura:

O Município de Contagem tomou conhecimento da instauração de inquérito civil pela 24ª Promotoria de Contagem – MPMG em decorrência de representação do “Movimento Libertas Minas” com a finalidade de apurar os possíveis desdobramentos da decisão proferida nos autos do processo nº 5019033-78.2018.8.13.0079, relativa à legalidade do IPTU residencial cobrado por Contagem em 2017.

Inicialmente, é preciso informar que o procedimento foi recentemente instaurado e que o Município ainda não teve oportunidade de manifestar e apresentar suas considerações e fundamentos no procedimento.

Ainda assim, o Município reitera que a decisão utilizada na representação refere-se a uma decisão isolada (processo nº 5019033-78.2018.8.13.0079) em processo individual patrocinado pelo advogado do Movimento responsável pela representação. Neste caso específico, a Procuradoria-Geral inclusive já apresentou recurso ao TJMG demonstrando que a cobrança do imposto em 2017 respeitou tanto a anterioridade anual, quanto a nonagesimal, conforme jurisprudência consolidada no Supremo Tribunal Federal. Portanto, o caso ainda está em análise, sem previsão de julgamento definitivo, e somente terá aplicação para o autor do processo.

Em relação à regularidade da cobrança do IPTU residencial do exercício de 2017, a Procuradoria-Geral relembra que naquele ano, a questão foi amplamente discutida, seja por meio de ações com repercussão coletiva, seja por processos individuais. Foram propostas duas Ações Diretas de Inconstitucionalidades-ADI, uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental -ADPF junto ao STF, duas Ações Populares,  todas já extintas sem invalidar o IPTU residencial de 2017.

Cabe destacar que na mesma ocasião foi instaurado um inquérito civil com idêntico teor e propósito (Autos nº 0024.17.002829-4), que foi arquivado por decisão da Procuradoria-Geral de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais.

O Município reforça que não tem ciência de qualquer decisão judicial com efeito geral que tenha determinado o cancelamento ou devolução de valores do IPTU de 2017, de modo que prevalece a regularidade e legalidade da cobrança.

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