Dívida de Minas com a União: não me engana que eu não gosto

O governador que se insurgir contra a proposta será acusado de opositor da Educação
Zema comenta sobre dívida de Minas com a União e o programa Juros Por Educação
Juros Por Educação é bom programa, mas por que condicionar às dívidas estaduais? (Foto: Governo de Minas/Divulgação)

Adoro citações populares, mas só quando o bom humor permite e minha inteligência não é acintosamente afrontada. Há meses, a partir de “conversas-aula” com técnicos brilhantes (sem paixões políticas) ligados ao governo mineiro, venho defendendo uma solução radical para a dívida mineira junto ao governo federal.

Entendam como radical o pagamento correto, a partir de um cálculo que – antes de quaisquer outros aspectos como juros e prazo – indique o montante principal de forma justa, levando-se em conta toda a receita surrupiada de Minas pela União e a devolução da agiotagem oficial que imperou nas últimas décadas sobre essa perda.

Em textos anteriores (abaixo, ao final desta coluna), explicitei como o governo federal manobrou, ao longo dos anos, para transferir a arrecadação de impostos do Estado para a União – sobretudo a CSLL -, e como captou dinheiro no exterior a juros mais baixos do que emprestou aos estados endividados. Só em Minas, foi coisa de centenas de bilhões.

NÃO DEVO, NÃO PAGO

Por essas contas inquestionáveis e irrefutáveis, diante de uma dívida atual de pouco mais de R$ 160 bilhões, o governo federal se tornaria devedor, e não credor, de Minas Gerais. Sem contar nos bilhões de reais já pagos, tendo como consequência não apenas o prejuízo direto à população mineira, mas o inaceitável incremento do principal.

Para quem não entendeu, explico: apesar de todo o dinheiro já enviado a Brasília, para pagamento de juros, o montante principal da dívida de Minas só cresceu, e assim continuaria caso o RRF (Regime de Recuperação Fiscal) entrasse em vigor. A Assembleia mineira (ALMG), até o momento, não aprovou a adesão.

Desejado pelo governo mineiro e defendido por Romeu Zema como a única solução, foi rebatido pelos parlamentares até que uma interlocução direta com o Palácio do Planalto, via os presidentes da Assembleia e do Senado, respectivamente Tadeu Martins (MDB) e Rodrigo Pacheco (PSD) fosse iniciada com Fernando Haddad e Lula.

ZEMA ACORDOU

Minas, por decisão provisória do Supremo Tribunal Federal (STF), está sem pagar as parcelas da dívida desde novembro de 2018. A decisão valeria até dezembro de 2023, foi prorrogada para o fim de abril deste ano e, novamente, seguirá indefinida até que União e estados endividados encontrem uma solução.

São Paulo capital, anos atrás, conseguiu um excelente acordo e conciliou “Caixa X Pagamento”. O Rio de Janeiro, recentemente, ajuizou ação no Supremo no sentido de providências contra a indecorosa agiotagem federal. Minas, surpreendentemente, encontrava-se calado, apesar dos gritantes abusos da União.

Estes dias, o governador Romeu Zema acordou do transe fiscal e começou a ecoar o que vinha sendo dito – inclusive através de ações judiciais de iniciativa popular – e finalmente a remar contra a corrente defendida pelo seu secretariado (anterior e atual) da Fazenda, a despeito de tantas informações técnicas em contrário.

HISTÓRIA DA CAROCHINHA

O anúncio em conjunto desta terça-feira (26) entre Minas, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e governo federal do tal “Juros Por Educação”, a despeito de sinalizar algum caminho, não me enche os olhos nem me aplaca a indignação. Já vivi o suficiente para não acreditar em anúncios midiáticos envoltos em nomes bonitos, vendidos como programas populares.

Juros extorsivos não são mercadoria de troca, e investimento em educação é prerrogativa dos estados, ainda que tenham o grosso do dinheiro concentrado em Brasília. Não me venham, portanto, com programinha “me engana que eu gosto”, porque não gosto. Não quero redução de juros como se fosse um favor. Ou moeda de troca.

E mais! Quando irão enfrentar o valor da dívida? 160 ou 170 bilhões de reais não são nem (f) dendo, se é que me entendem. Redução justa e honesta já! Sem isso, não tentem me vender bugalho como alho, para não dizer esterco como caviar. Entendo a posição do governador, mas para quem se manteve inerte até agora, o adesismo não soará melhor.

EDUCAÇÃO COM FEDERALIZAÇÃO

Todo centavo investido em Educação é e será muito bem-vindo, sempre! Discorrer sobre a miserabilidade da Educação brasileira e desfilar nossos precários números e índices é chover no molhado. Eis o “aplique” da hora, travestido como acordo com os estados. O governo federal encontrou uma maneira de espetar no lombo alheio sua responsabilidade.

Sim. A União, que concentra quase 70% de toda a arrecadação dos entes federados, usa a Educação como forma de chantagem, afinal, o governador que se insurgir contra a proposta será acusado de opositor ao desenvolvimento educacional do País. Atenção: há mais um “aplique” na parada. A possibilidade de abatimento da dívida através da venda de ativos.

No “Juros Por Educação” (que nome cretino!!), há previsão de abatimento de 10% a 20% do principal da dívida, para a redução de juros (entre 0.5% e 1%), utilizando-se patrimônio dos estados. É sabido o desejo do governo de Minas de federalizar estatais como Codemig, Cemig e Copasa, bem como o apetite de Lula por toda e qualquer estatal.

ENCERRO

Juntos, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul devem quase 90% do estoque do butim perante a Federação. Não é possível que estes governadores não consigam botar o dedo na ferida e impor o que é justo. Salvo se estiver faltando coragem, capacidade técnica ou boa fé, de suas partes, para com suas populações.

Como moro em Minas, estou me lixando para os demais estados. Por isso, continuarei gritando: qual é o valor correto dessa maldita dívida com a União? Por que a tungada que levamos com a CSLL – e nem vou falar em Lei Kandir e outros temas correlatos – não está sendo discutida? Nosso governo continuará omisso nesse tema?

Eu sei que nossos congressistas estão satisfeitos com o atual modelo de dependência extrema do Estado pois, como a União, ganham poder com tal concentração. Mas não entendo prefeitos e governadores continuarem permitindo tal subordinação, salvo gostarem da romaria diária à Brasília, com o pires na mão, implorando pelo quinhão que, por direito, já deveria ser seu.

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