Relembre o fim de 2022, quando ‘kids pretos’ planejavam golpe

Planejamento de operação golpista não foi no vácuo, e sim em contexto de respaldo político
Polícia e militares se concentram na frente do QG do Exército para desmontar acampamento bolsonarista em 09.jan.2023
Polícia e militares se concentram na frente do QG do Exército, em Brasília, para desmontar acampamento bolsonarista, em 9 de janeiro de 2023. Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

A Polícia Federal deflagrou na manhã desta terça (19) a Operação Contragolpe, que prendeu cinco pessoas – quatro deles militares das Forças Especiais, os chamados ‘kids pretos’.

A PF investiga um grupo criminoso por ter tentado planejar um golpe de Estado e matar Lula e Alckmin, e “neutralizar a capacidade de atuação” do ministro Alexandre de Moraes.

O planejamento era executar as ações em dezembro de 2022 – depois da vitória eleitoral de Lula e Alckmin mas antes da posse.

Entre os presos hoje está o general da reserva Mario Fernandes, que foi nº 2 da Secretaria-Geral da Presidência no governo Bolsonaro, e trabalhou até março deste ano como assessor do deputado General Pazuello (PL-RJ), ex-ministro da Saúde.

Mario Fernandes estava na reunião golpista no Palácio do Planalto gravada em julho de 2022. O vídeo veio à tona apenas em fevereiro deste ano, e foi encontrado pela PF no computador de Mauro Cid.

Na reunião, o general Mario diz a Bolsonaro e aos ministros: “temos que ter um prazo para que isso aconteça e não para que eles raciocinem que é importante avaliar essa possibilidade, mas principalmente para que uma alternativa seja tomada, como o senhor [Bolsonaro] bem disse, antes que aconteça (…) tem que ser antes, tem que acontecer antes. Queremos, dentro do estado de normalidade, mas é muito melhor assumir um pequeno risco de controlar o país, pensando assim, para que aconteça antes, do que assumir risco muito maior da conturbação”.

O general Mario e os demais ‘kids pretos’ não estavam atuando num vácuo. Vamos relembrar o que ocorria no fim de 2022, depois da vitória de Lula.

Acampamentos golpistas

Manifestantes bolsonaristas montaram acampamentos próximos a várias instalações militares em todo o Brasil – inclusive na Av. Raja Gabaglia, em BH.

Um desses acampamentos ficou em frente ao Quartel-General do Exército, no Setor Militar Urbano (SMU) de Brasília.

Como mostra o relatório da PF, o general Mario tirou várias fotografias no acampamento de Brasília. Outros militares da reserva e parentes de militares frequentavam o acampamento, como sabemos hoje.

“Convém salientar que, no período em que esteve presencialmente nessas manifestações antidemocráticas, MARIO FERNANDES ainda ocupava o cargo de Chefe Substituto da Secretaria-Geral da Presidência da República, possuindo estreita proximidade com o então Presidente JAIR BOLSONARO”, anotou a PF.

No fim de dezembro de 2022 a PM-DF tentou desmontar o acampamento, mas o “Exército desistiu da operação”, como disse em coletiva de imprensa na época o então comandante-geral da PM, coronel Fábio Augusto Vieira.

Bloqueios de estradas

Enquanto alguns bolsonaristas ficavam nos acampamentos, outros preferiram bloquear estradas. No começo de novembro, a PRF publicou ter desfeito 631 (!) ações de interdição ou bloqueios em estradas federais em 15 estados.

Os manifestantes tinham óbvio respaldo político. Em 1º de novembro, Marco Antônio Territo, então diretor-executivo da PRF, disse em coletiva de imprensa não saber qual era a pauta dos manifestantes bolsonaristas.

“[A gente] não consegue também verificar qual que seria a pauta, tá?”, disse Territo.

A audiência no Senado

Parlamentares bolsonaristas participaram em 30 de novembro de uma audiência pública no Senado com a intenção declarada de “discutir” a eleição de 2022. A audiência foi pedida pelo senador Eduardo Girão. Quase todos os principais nomes bolsonaristas do Congresso participaram.

A então deputada Aline Sleutjes (Pros-PR) foi claríssima: “Nós precisamos agir rápido. Dia 12 [de dezembro] tem uma diplomação que eles querem que aconteça (…) Nós só temos 11 dias (…) para as Forças Armadas fazerem a parte delas”.

Para Sleutjes, a diplomação de Lula seria algo que “eles querem que aconteça” e não consequência formal de sua vitória eleitoral.

Também nessa audiência, Marcel van Hattem (NOVO-RS) disse que “a ruptura já aconteceu”.

Carlos Jordy (PL-RJ) prometeu: “Eu vou lutar até o fim pela liberdade”.

O blogueiro argentino Fernando Cerimedo, que disseminou a teoria da conspiração sobre as “urnas velhas”, participou por videoconferência.

A mesma tese falsa de que as urnas velhas não seriam auditáveis tinha sido usada pelo Partido Liberal dias antes para desafiar formalmente o resultado da eleição com uma petição no TSE.

O plano para grampear Moraes

No começo de 2023 o senador Marcos do Val (Podemos-ES) deu uma entrevista à Veja.

Na entrevista, do Val disse que Bolsonaro lhe pediu para gravar conversas de Alexandre de Moraes, para, nas palavras da revista, “flagrar o magistrado em alguma inconfidência ou indiscrição e usar o material como argumento para anular as eleições, impedir a posse de Lula e manter o ex-capitão no poder”.

Mensagens mostradas pela revista mostram que do Val pediu para falar pessoalmente com Moraes.

Depois da publicação da entrevista, Moraes confirmou ter se encontrado com o senador, que se recusou a formalizar a denúncia.

Os planos que tinham Moraes como alvo, portanto, eram muitos.

Leia também:

BHP Brasil anuncia novo presidente

Deputados adiam votação de projeto que aumenta bancada de MG

Após calotes, governo de Minas adota nova tática para acordos de leniência

Veja os Stories em @OFatorOficial. Acesse