Ex-deputado não comprova gastos, mas Justiça rejeita ação

Investigação começou após carta de cidadão questionando uso da verba indenizatória
Inquérito foi aberto após denúncia feita por cidadão que levantou gastos do gabinete de Anselmo Domingos
Justiça não enxergou irregularidade / Foto: Divulgação (ALMG)

A 4ª Vara da Fazenda Pública de Belo Horizonte rejeitou ação do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) que pedia a condenação por corrupção e devolução de quase R$ 200 mil do ex-deputado estadual Anselmo Domingos por supostas irregularidades no uso da verba de gabinete destinada ao custeio com o abastecimento de veículos. Segundo a juíza Janete Gomes, não ficou comprovada a intenção do ex-parlamentar em obter vantagem com os recursos utilizados (previstos pelo regimento da Assembleia) e, por isso, a ação foi rejeitada. A decisão é de 13 de dezembro passado e foi publicada nesta semana.

Segundo o MP, entre 2011 e 2014, o ex-deputado teria utilizado pouco mais de R$ 194 mil, em valores atualizados, da verba indenizatória – criada para auxiliar o gabinete dos deputados com despesas do dia a dia – em gasolina, mas não teria comprovado se os veículos abastecidos estariam sendo, ou não, usados em atividades parlamentares: “Não houve transparência na prestação de contas das verbas destinadas ao ressarcimento de despesa de combustível, não sendo possível comprovar que o veículo em tela fora utilizado em atividade parlamentar, já que não fora apresentadas informações acerca dos dados do contribuinte adquirente, placa, e quilometragem do hodômetro do veículo abastecido. O Deputado nem ao menos apresentou cupons fiscais de abastecimento para comprovação de gastos com combustíveis”, pontuava a ação inicial do MPMG.

Apesar disso, a gestão da Assembleia, na época dos fatos, aprovou as contas e não viu irregularidades: “Neste diapasão, cada Poder possui seu plexo de competências, a fim de ferir suas atividades e contas dentro de sua esfera, devendo decidir quais recursos serão disponibilizados aos seus membros no desempenho de suas funções. Com efeito, a atuação legislativa goza de presunção de legalidade de seus atos, cabendo ao interessado rechaçar tal presunção apresentando elementos probatórios cabais. In casu, há certidão de regularidade de prestação de contas para com a Assembleia Legislativa, logo, para o afastamento da presunção de que a Assembleia Legislativa agiu em desconformidade em aprovar as contas do réu, exige-se a comprovação da conduta ilícita, não bastando, para tanto, a mera alegação de suposta conduta reprovável”, mostra trecho da decisão da juíza.

POLÊMICA

Com a nova lei de improbidade administrativa, aprovada e sancionada em 2021, casos suspeitos de corrupção só podem sofrer condenações se os investigadores comprovarem que houve, ali, a intenção de cometer o dolo, ou seja, se restar provado que a intenção era mesmo roubar dinheiro público. Só a má gestão de recursos do contribuinte, ou falta de transparência, não é mais passível de punição. Há o debate se a antiga legislação inviabilizava certa agilidade e autonomia da gestão pública.

A propósito, o caso do ex-deputado Anselmo Domingos traz uma curiosidade única: a investigação do MP mineiro começou depois que um cidadão realizou um minucioso levantamento dos gastos do gabinete do parlamentar, após receber uma carta de aniversário, enviada pela equipe do próprio deputado. Veja trechos:

“Ilmo. Sr. Deputado Anselmo José Domingos (PTC-MG), escrevo-lhe na condição de um cidadão preocupado com a destinação dos nossos escassos recursos públicos, especialmente no que diz respeito aos gastos realizados com a chamada ‘verba indenizatória’ da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

Em meados de dezembro de 2012, recebi uma correspondência remetida pelo gabinete de V. Exa., na qual o Sr. me desejava “Feliz Natal”. Estranhei o fato por diversos motivos, entre eles:

a) Eu não conhecia o Sr.;

b) Eu não conhecia o seu partido (PTC) e nunca me inscrevi para receber qualquer tipo de correspondência de qualquer partido;

c) Fiquei intrigado pelo fato de a correspondência ter sido emitida pelo seu gabinete em envelope timbrado da Assembleia, e me perguntei se aquela correspondência porventura, não teria sido paga com recursos públicos”.”

Assim, analisei Nota Fiscal por Nota Fiscal da atividade do Sr. nos exercícios de 2011, 2012 e 2013. Durante a análise, encontrei alguns aspectos curiosos. Em primeiro lugar, parabenizo-lhe pela perfeita utilização dos recursos no ano passado: somando-se os 12 meses, o resultado é de exatamente R$ 240.000,00 (R$ 20.000,00 por mês, limite mensal para gastos da verba). Nem um centavo a mais, nem um centavo a menos.”

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